sexta-feira, 31 de julho de 2009

O Significado da prece de sete linhas












O Significado da prece de sete linhas

por Mipham Namgyal (1846-1912)

HUNG!
ORGYEN YUL-KYI NUP-CHANG TSHAM,
PEMA KESAR DONG-PO LA,
YA-TSHEN CH'OG-KI NGODRUP NYEY,
PEMA JUGNE ZHEY-SU TRAG,
KHORTU KHADRO MANGPO KOR.
KHYED-KYI JEYSU DAG-DRUB KYEE,
CHIN-KYEE LAB-CH'IR SHEGSU SOL,
GURU PEMA SIDDHI HUNG.






O Significado da
Prece Vajra de Sete Linhas
a Guru Rinpoche




ESTE TEXTO é o resumo de um comentário sobre a Prece Vajra de Sete Linhas intitulado Padma Karpo (Lótus Branca), escrito por Mipham Namgyal (1846-1912), um reconhecido erudito da tradição Nyingma do Budismo Tibetano. O texto original em tibetano do comentário de Mipham é muito profundo e difícil de compreender ou traduzir, portanto resumi os pontos básicos deste texto aqui.


A Prece Vajra de Sete Linhas é a mais sagrada e importante oração da tradição Nyingma. Esta curta oração contém os ensinamentos externo, interno e secreto dos treinamentos esotéricos do Budismo. Através da prática da Prece Vajra de Sete Linhas de acordo com qualquer destes treinamentos, o resultado deste treinamento particular será obtido.


Neste resumo há cinco níveis de interpretação. Estes são (1) o significado geral ou comum; o caminho do significado oculto (sBas Don), que consiste dos três níveis seguintes; (2) o significado de acordo com o caminho da liberação (Grol Lam); (3) o significado de acordo com o estágio da conclusão2 (rDzog Rim); (4) o significado de acordo com o Nyngthig de Dzogpa Chenpo: a realização direta do espontâneo (Lhun Grub Thod rGal); e (5) o significado de acordo com a conquista do resultado. Destes níveis de significado é aconselhável que a pessoa que recita a oração vajra aprenda e pratique o nível particular condizente com sua capacidade.


Muitos seguidores dos ensinamentos Nyingma, apesar de familiarizados com a Prece Vajra de Sete Linhas, geralmente não conhecem seus significados mais profundos. Por esta razão organizei este resumo, esperando ser capaz de explicitar o conteúdo dos diferentes níveis de significado e treinamento contidos nesta curta oração. Porém, de forma a compreender o significado completo da oração, aconselho os leitores a lerem o texto original de Mipham Rinpoche.


No Tibete, os Nyingmas recitam a Prece Vajra de Sete Linhas a Guru Rinpoche três vezes antes de recitar quaisquer outras orações, fazer qualquer meditação, ou realizar qualquer cerimônia. Muitos devotos repetem-na centenas de milhares de vezes, recitando-a durante todo período de vigília como sua principal oração, respiração, vida e contemplação.




Estrutura do Texto


Devido a complexa organização do texto, vários cabeçalhos, subcabeçalhos, itálicos e colchetes foram adicionados. Uma nota de explicação portanto ajudará o leitor.


O comentário de Mipham dividiu cada nível de interpretação da Prece Vajra de Sete Linhas em uma introdução, a pronúncia da sílaba semente, o objeto da oração, a oração, o mantra para a invocação de bênçãos, e (somente para o primeiro nível de interpretação) os conteúdos da oração.


A partir de cada nível de interpretação no comentário de Mipham extraí da Prece Vajra de Sete Linhas um significado raiz. Em cada nível de interpretação este significado raiz aparece em primeiro lugar, seguido do comentário de Mipham (com suas subdivisões).


Com relação ao formato, há três usos diferentes do itálico. Em primeiro lugar, no corpo do texto, os itálicos são algumas vezes utilizados para palavras tibetanas incomuns (colocadas em forma fonética), seguidas por algum equivalente em português ou, ocasionalmente, por um equivalente em sânscrito (indicado pela abreviação Sct.) em parênteses. No segundo caso temos as palavras portuguesas em itálico, que aparecendo no comentário, são desta forma convencionadas como as próprias palavras traduzidas da Prece Vajra de Sete Linhas. O leitor é encorajado, ao ler o comentário, a rever continuamente a sessão do significado raiz, de forma a perceber como as palavras em itálico formam um coerente significado fundamental. E finalmente, começando com o nível do sentido oculto (segundo) em diante, os significados esotéricos nas sessões de significados raízes são seguidos pelas frases correspondentes da Prece Vajra de Sete Linhas, que são colocadas em parênteses em itálico como tibetano fonético.


Ao longo do texto, os colchetes são algumas vezes utilizados para indicar palavras adicionadas de forma a tornar o significado mais inteligível. Finalmente, de forma a manter as notas de rodapé ao mínimo possível, os termos chave em tibetano foram colocados transliterados em parênteses.


Há diferenças de grafia em dois lugares no tibetano da Prece Vajra de Sete Linhas. Como última sílaba da linha 6, utilizei kyee (Kyis) seguindo o comentário de Mipham. Alguns textos utilizam kyi (Kyi). Para a terceira sílaba da sétima linha utilizei lab (brLab), como nos textos Longchen Nyingthig e na versão mais recitada, apesar de Mipham e alguns terem utilizado lob (rLobs).




História da Prece Vajra de Sete Linhas


Diz-se que estas linhas são orações de convite a Guru Rinpoche (Padmasambhava) para a assembléia3 das oferendas de festim realizadas pelas Dorje Khadromas (Sct. Vajra Dakinis).


Certa vez chegaram alguns professores hereges ao mosteiro de Nalanda, que, conhecedores de línguas e lógica, insultaram o Dharma. Os eruditos budistas não foram capazes de refutá-los. Então grande parte dos eruditos teve o mesmo sonho. Nele, Dakini Zhiwa Chog (Paz Suprema) profetizava como segue:


"Não sereis capazes de derrotar os hereges. Se não convidarem meu irmão mais velho, Dorje Thöthreng Tsal (Poder Guirlanda-de-Crânios Vajra, Guru Rinpoche), que vive no Cemitério Negro, a comparecer aqui, o Dharma será destruído."


"É muito difícil chegar lá , como poderemos convidá-lo?" perguntaram os eruditos.


A Khadroma disse: "Preparem uma grande oferenda no topo do mosteiro, com música e incenso, e em voz única recitem a Prece Vajra." E então ela lhes deu a Prece Vajra de Sete Linhas. Os eruditos a rezaram e imediatamente Guru Rinpoche veio miraculosamente pelo céu. Ele chefiou os eruditos budistas e derrotou os professores hereges por meio de referência a textos e racionalização. Quando foi ameaçado pelo poder mágico dos hereges, abriu a caixinha que a Dakini Face-de-Leão lhe deu e lá encontrou o mantra de "quatorze letras"4. Ao recitá-lo, eliminou os hereges malignos com uma tempestade de raios. Converteu os restantes ao Dharma. Diz-se que a prece originou-se neste incidente.


Mais tarde, quando Guru Rinpoche veio ao Tibete no século oito, ele concedeu-a ao rei e súditos. Pretendendo-a para discípulos futuros capazes de treinamento, escondeu-a em muitas Ters. Tempos depois, a Prece Vajra de Sete Linhas foi revelada nas Ters5 da maioria dos cem grande Tertons dos últimos dez séculos da linhagem Nyingma, repetidas vezes, como o coração das orações, ensinamentos e meditação.




O Significado Comum


Significado Raiz


HUM – Invoca a mente de Guru Rinpoche

1. No noroeste do país de Oddiyana
2. Nascido no pistilo de uma lótus:
3. Provido da mais maravilhosa realização;
4. Renomado como o Nascido-da-Lótus (Padmasambhava);
5. Cercado por um séquito de muitas Khadros
6. Seguindo-te pratico:
7. Por favor venha conceder bênçãos.


Mestre (GURU) Padmasambhava (PEMA), por favor [nos] conceda (HUM) realizações (SIDDHI).


Comentário


Introdução

Este é o nível de prática da Prece Vajra de Sete Linhas relacionado ao tipo de aparição de Guru Rinpoche neste mundo terreno como uma forma manifesta (Sct. Nirmanakaya).


Guru Rinpoche na verdade não é separado de Samantabhadra (Universalmente Excelente), que desde o princípio é totalmente liberto como o Dharmakaya (a vacuidade luminosa) auto-manifesto. Sem mover-se da esfera do Dharmakaya, ele é espontaneamente realizado no Sambhogakaya (o corpo de deleite nas formas puras), que tem cinco qualidades absolutas7. Ele é também a aparição auto-manifesta em diversas formações de Nirmanakaya (o corpo manifesto em formas impuras), o auto-reflexo da compaixão. Esta é a forma real através na qual Guru Rinpoche aparece e permanece. É a manifestação visual dos Budas, e somente eles podem perceber todos os aspectos dela.


Oito (ou doze) anos após o mahaparinirvana de Buda Sakyamuni, Guru Rinpoche apareceu neste mundo para os seres comuns com bom carma numa lótus no lago Dhanakosha em Oddyana. Ele seguiu varias disciplinas esotéricas e alcançou muitas realizações, tais como o corpo luminoso da grande transformação (‘Ja’ Lus ‘Pho Ba Ch’en Po). Ele serviu aos devotos da Índia, Oddyana e Tibete através de manifestações múltiplas, tais como as oito formas do Guru (Guru mTshan brGyad). Este nível de interpretação é como nós, discípulos comuns, oramos a Guru Rinpoche, um extraordinário objeto de devoção.


A Pronúncia da Sílaba Semente


A oração começa com a invocação da mente iluminada de Guru Rinpoche pela pronúncia da sílaba HUM, a auto-manifesta sílaba semente da mente de todos os Budas.


O Objeto da Oração


Linha 1. No oriente do continente de Jambu, ao noroeste de Oddyana, a terra das Khadros (Dakas e Dakinis) no lago Dhanakosha, preenchido com a água das oito qualidades puras,


Linha 2. No caule ornamentado pelo pistilo, folhas e pétalas de uma lótus, nasceu Guru Rinpoche.


Todas as qualidades e bênçãos dos três segredos (corpo, fala e mente) de todos os Budas vieram unidas na forma da sílaba HRIH, e dissolveram-se no coração de Buda Amitaba. De seu coração, uma luz de cinco cores espalhou-se e desceu ao pistilo da lótus. As cores transformaram-se na forma de Guru Rinpoche, e ele então nasceu no miraculoso modo do nascimento na lótus.


Linha 3. Ele realizou espontaneamente o benefício duplo (para si e para os outros) e exibiu formas maravilhosas, tais como as oito manifestações do Guru. Ele alcançou a realização extraordinária do estado do Vajradhara, não apenas realização comum.


Linha 4. Seu nome é renomado como o Nascido-do-Lótus (Padmasambhava).


Linha 5. Ele está cercado por séquitos de múltiplas Khadros (Dakas e Dakinis).


A Oração


Linha 6. Deve-se orar com os três tipos de fé8, pensando, "Ó protetor, seguir-te-ei, e portanto praticarei."


Linha 7. "De forma a proteger seres como eu mesmo, que estão afundados no oceano dos três sofrimentos. Ó tu, onisciente, compassivo e poderoso, vem por favor, pela bênção de seu corpo, fala e mente a este lugar. Vem com teu corpo, fala, e mente, como transmuta-se ferro em ouro."


O Mantra para Invocar Bênçãos


GURU significa mestre ou guia espiritual, um que é próspero de qualidades excelentes; a quem ninguém supera.

PADMA é a primeira parte do nome de Guru Rinpoche.

SIDDHI é o que queremos conquistar – as realizações comuns e incomum.

HUM significa a súplica pelo conferimento de siddhis (realizações).

Assim, Ó Guru Padma, conceda o siddhi.


Os Conteúdos da Oração

Os Objetos da Oração


Linha 1. O lugar do nascimento.


Linha 2. A maneira pela qual nasceu.


Linha 3. A grandeza de suas qualidades.


Linha 4. O nome de Guru Rinpoche em particular.


Linha 5. Séquitos.


A Oração


Linha 6. Orar com a aspiração de conquistar a inseparabilidade de Guru Rinpoche ou desenvolver confiança nele.


Linha 7. Conquista da inseparabilidade de Guru Rinpoche com o orador.


O Mantra para Invocar Bênçãos

GURU PADMA SIDDHI HUM



O Caminho para o Significado Oculto

O Caminho da Liberação


Significado Raiz


HUM – desperta a sabedoria auto-manifesta, a natureza do absoluto.


1. A Mente9 (ogyen yul) é a liberdade (tsam) [dos extremos] do samsara (nub) e nirvana (chang).


2. É a realização da união (dongpo) da esfera absoluta primordialmente pura (pema) e luminosa, a atenção vajra plena (kesar) e (la)


3. É a Grande Perfeição, o maravilhoso (yatsen). É a conquista (nye) do siddhi supremo (chogki ngödrub), o estado de Vajradhara.


4. Esta é a sabedoria da natureza do absoluto, renomada como (zhesu trag) a origem última (jugne) dos Budas (pema).


5. A sabedoria está munida de (kor) inúmeros poderes (mangpo) de manifestação, emanando (dro) da esfera do absoluto (kha) como atributos (khortu).


6. Com firmeza desenvolvo confiança (dag drub kyee) na natureza da sabedoria primal não-dual (khye kyi je su).


7. De forma a (chir) purificar todos os apegos às aparências na forma de sabedoria primordial (chinkyee lob), possa eu conquistar (shegsu sol) a natureza última.


A sabedoria primordial é vacuidade em sua essência (Dharmakaya) (GURU), tem a clareza por qualidade (Sambhogakaya) (PEMA), e é toda envolvente em compaixão [poder] (Nirmanakaya) (SIDDHI) com sabedoria quíntupla (HUM).


Comentário


A Pronúncia da Sílaba Semente.


A oração começa com a pronúncia da sílaba semente da mente, HUM, que desperta a sabedoria primordial auto-manifesta, a natureza real de samsara e nirvana.








O Objeto da Oração

Linha 1. O país de Oddiyana é uma fonte especial do tantra. Em termos do caminho real, nossa própria Mente é a fonte especial do tantra, portanto é isso que "Oddiyana" significa.


A Mente ou a natureza absoluta da mente é a liberdade de não afundar no samsara e não flutuar para o nirvana, já que ela não é nem permanecer nem tomar partido com relação aos dois extremos – samsara e nirvana.


Linha 2. Pema, a lótus, representa a esfera absoluta (Dharmadhatu), a natureza que está para ser conquistada. Não habita lugar algum e é pura desde o princípio, da mesma forma que uma lótus não é manchada por impureza alguma.


"Kesar", o pistilo, representa a atenção plena luminosa vajra (Rig Pa’i rDo rJe), que é o meio através do qual realiza-se esta natureza. A atenção plena brilhante por si só é a sabedoria primordial, floresce com clareza; portanto lembra o pistilo de uma lótus.


Como o caule (Dongpo) mantém o pistilo e as pétalas de uma lótus juntos, a auto-manifesta, grande e extática sabedoria primordial habita como a união da esfera do absoluto (dByings) e da sabedoria primordial (Ye Shes), e é a derradeira natureza da mente ou a luminosidade inata da mente.


Linha 3. A Mente é a Grande Perfeição (Dzogpa Chenpo) luminosa espontaneamente nascida, a sabedoria primordial da natureza absoluta, o significado da quarta iniciação, que é maravilhosa. Está presente espontaneamente como o fundamento da Mente de todos os Budas, a conquista do siddhi supremo, o estado de Vajradhara.


Linha 4. A Mente é a fundação de todos os Budas dos três tempos, que floresceram como flores de lótus, a natureza última; assim ela é renomada como a origem de Pema, os Budas. Este é o reconhecimento de Pema Junge como o Buda absoluto.


Linha 5. Nesta sabedoria primordial estão qualidades inconcebíveis de realização as quais, se divididas em suas variedades, incluem os cinco tipos de sabedoria primordial (Ye Shes lNga)10. Assim, no espaço desnudo da esfera do absoluto, diversos poderes manifestos da sabedoria da atenção plena primordial emanam incessantemente como seus atributos.


A Oração


Linha 6. Perceber a natureza da sabedoria primordial não-dual (Ye Shes) e aperfeiçoá-la através da contemplação com confiança imutável, que é a grande sabedoria (Shes Rab), é expresso como "Seguir-te-ei e praticarei."


Linha 7. Se temos experimentado e estamos assegurados desta natureza última (gNas Lugs) pela conquista da percepção (lTa Ba), e temos aperfeiçoado esta conquista através da meditação, transformaremos todos os apegos às aparências impuras na essência11 pura da sabedoria primordial (Ye Shes).


Ou, se não somos capazes de alcançar a sabedoria primordial de forma a receber as bênçãos do caminho em nossas próprias mentes, devemos então aspirar dessa forma: "Possa eu conquistar12 a natureza última (Ch’os Nyid) pela dissolução da dualidade objetivo-subjetivo nesta própria natureza, como ondas de água na água, através do poder das bênçãos das instruções do Lama e através do estudo e reflexão".


O Mantra para Invocar Bênçãos


A sabedoria primordial é a essência vazia (Ngo Bo sTong Pa), o Dharmakaya, e já que ela não é inferior a nenhuma característica concebível, é o supremo, o GURU.


A natureza da sabedoria primordial é luminosidade (Rang bZhin gSal Ba). É o Sambhogakaya espontaneamente realizado, com uma incessante manifestação de poder. Ainda assim não é separada da esfera derradeira. Assim é PADMA, a lótus, pois não é manchada pelas características relativas.


A inseparabilidade desta essência e natureza13 é a compaixão universal, que surge nas manifestações (Rol Pa) samsáricas, concedendo os desejos de todos os incontáveis seres. Ela é SIDDHI, a realização.


HUM significa a auto-manifesta sabedoria primordial, a sílaba semente da mente, possuidora das cinco sabedorias primordiais.






O Caminho dos Meios Hábeis (Thabs Lam)

de Acordo Com o Estágio da Conclusão


Significado Raiz


HUM – desperta a auto-manifesta sabedoria inata.


1. Ao centro (tsam) dos canais roma (nub) e kyangma (chang) do corpo vajra (ogyen yul),


2. Ao (la) chakra do coração (pema) na "essência" (Thig Le) (kesar), no uma, o canal central (dongpo)


3. Jaz (nye) a maravilhosa (yatsen), extática e imaculada mente da sabedoria primordial da essência luminosa imutável, a conquista do siddhi supremo (chogki ngodrub).


4. É renomada (zhesu trag) como o espontaneamente presente Padmasambhava absoluto (pema jugne).


5. Esta essência de sabedoria primordial têm (kor) muitos (magpo) tipos de energia (rLung) e essência (Thig Le), os quais estão manifestando-se na esfera da vacuidade (khadro) dos canais como ventos14 (khortu).


6. De acordo com a natureza de habilidade do corpo vajra (khye-kyi jesu), treinarei a sabedoria primordial (dag drub kyee) através dos estágios do aprendizado esotérico.


7. De forma a (chir) transformar tudo que existe na esfera do grande êxtase (chinkyee lab), possa eu atingir o grande êxtase do corpo vajra (shegsu sol).


A sabedoria primordial suprema (GURU) e o imaculado e auto-manifesto grande êxtase (PADMA) trazem a derradeira grande sabedoria primordial (SIDDHI), a Mente sagrada dos Budas (HUM).


Comentário


Introdução


Para aqueles que não são capazes de vivenciar a sabedoria primordial absoluta (Don Gyi Ye Shes) através dos treinamentos esclarecidos no caminho da liberação, ela pode ser atingida através dos mui extraordinários treinamentos do caminho dos meios hábeis.


A Pronúncia da Sílaba Semente


A sílaba HUM significa o despertar da auto-manifesta sabedoria primordial inata.


O Objeto da Oração


Linha 1. O país de Oddiyana representa o corpo vajra, a base extraordinária do tantra.


Neste corpo vajra, ao lado direito está o canal vermelho roma (Sct. rasana) no qual move-se a energia solar (Nyi Ma’i rLung), desgastando a essência (Tib. Thig Le, Sct. bindu). No lado esquerdo está o canal branco Kyangma (Sct. lalana) no qual move-se a energia lunar (Zla Ba’i rLung), incrementando, limpando, resfriando e pacificando a essência.


Entre estes canais, ao centro [onde a energia da sabedoria primordial flui]:


Linha 2. A lótus (pema) significa o Dharmachakra cardíaco de oito pétalas (sNying Ka Ch’os Kyi ‘Khor Lo), o pistilo (kesar) representa a essência (ou sêmen), o substrato vital dos cinco elementos. O caule (dongpo) representa a uma (Sct. avadhuti) ou canal central no qual flui a energia da sabedoria primordial (Ye Shes Kyi rLung)


Linha 3. Dentro deste ciclo de canal, energia e essência – a essência vital extraordinária (Dvangs Ma) do corpo vajra – e desde o princípio simultaneamente originando-se com eles, como cânfora e cheiro de cânfora, habita a essência luminosa (‘od gSal Ba’i Thig Le), que é o grande êxtase imaculado, a auto-manifesta sabedoria primordial.


Portanto é muito maravilhoso. Esta essência luminosa é a união inseparável de êxtase e vacuidade que transcende pensamentos e descrição, e é a conquista espontânea do siddhi supremo, Vajradhara.


Linha 4. A sabedoria primordial de atingir aquela essência luminosa é renomada como o absoluto, auto-manifesto Pema Jugne (Padmasambhava).


Linha 5. Aquela essência luminosa da sabedoria primordial, Padmasambhava, está com muitas essências e energias (rLung). Estas são seu poder de demonstrar (rTsal) a grande essência da própria sabedoria primordial. Elas estão manifestando-se no espaço dos tubos ocos do canal central e canais menores como seus ventos. Se aplicamos o treinamento em meios hábeis, o ciclo do corpo vajra surge como a sabedoria primordial grandiosamente extática da essência luminosa.


A Oração


Linha 6. "Seguir-te-ei e praticarei" significa, em primeiro lugar, que há treinamento na compreensão e conquista da natureza do corpo vajra; e em segundo lugar, a sabedoria primordial do grande êxtase através dos treinamentos profundos com características (mTshan bChas Kyi rNal ‘Byor) do estagio da conclusão (rDzogs Rim), os quais incluem a prática da ioga do calor (gTum Mo), os treinamentos com apoio de consortes vajra internas ou externas. Estes treinamentos trarão o resultado de permitir a entrada das energias e mente cármicas no canal central, e a realização do estado de corpo ilusório, absorção luminosa e ioga dos sonhos, pela força dos exercícios físicos, da disciplina de energias e da concentração mental nas essências sutis (Phra Mo’i Thig Le).


Linha 7. Através do treinamento dos meios hábeis, transformamos todas as coisas existentes na conquista da natureza do grande êxtase imaculado do corpo vajra, e então as transformamos em mandalas do corpo, fala e mente dos Budas. De forma a alcançar o grande êxtase do corpo vajra, todas as inclinações habituais da energia cármica mutável – a causa das aparições samsáricas, devidas a mente profanada por pensamentos com características – dissolvem-se no canal central de sabedoria primordial imutável, e desta forma somos atados a grande essência imutável, a derradeira esfera real do fundamento. Assim, Venha ao (conquiste o) Dharmakaya, a derradeira esfera do fundamento.


O Mantra para Invocar Bênçãos


A sabedoria primordial do caminho, que é alcançada através do caminho extraordinário do treinamento, é suprema; daí GURU (mestre).


Todas as impurezas, tais como as cinco aflições emocionais, surgem como apoios ao grande êxtase imaculado e a auto-liberação; daí PADMA (lótus)


Como resultado final, a grande sabedoria primordial será alcançada rapidamente; daí SIDDHI (conquista, realização).


Maravilhada com a aparição da sabedoria primordial através do treinamento no caminho dos meios hábeis vem a sílaba semente das Mentes dos Budas – HUM.






De Acordo com a Nyingthig do Dzogpa Chenpo:

A Percepção Direta da Presença Espontânea


Significado Raiz


HUM – Invoca a auto-manifesta sabedoria que traz a percepção da face da sabedoria primordial derradeira.


1. A luz do coração (ogyen yul) e sua (kyi) esfera interna derradeira (nub), esfera externa derradeira (chang), a luz aquosa dos olhos (tsam), e


2. A luz da esfera mais pura e a luz da vacuidade thig-le (pema) com o contínuo vajra – o poder da pura atenção plena – (kesar) estão presentes. Sobre (la) a pura atenção plena firmemente aí estabilizada através da contemplação (dongpo),


3. Conquistamos (nye) as maravilhosas (yatsen) três primeiras visões (sNang Ba) e alcançamos o siddhi supremo (chogki’ ngödrub), a quarta visão.


4. Esta conquista é renomada (zhesu trag) como a conquista da natureza de Buda primordial (pema jugne).


5. Então a luz da auto-manifesta sabedoria emana (kor) muitos (mangpo) raios e thig-les como seu poder de manifestação (rTsal) (khortu) movendo-se através do espaço (khadro).


6. Contemplo (dag drub kyee) a visão natural da pureza original (khye kyi jesu).


7. De forma a (chir) atingir o corpo vajra de arco-íris da grande transformação (shegsu sol), possa eu purificar todos os fenômenos na imensidão da sabedoria primordial (chinkyee lab).


Esta suprema (GURU), imaculada (PADMA), e derradeira realização (SIDDHI) é fantástica (HUM).


Comentário


Introdução


A auto-manifesta sabedoria primordial natural jaz fundamentalmente como a natureza última (Ch’os Nyid) da mente. Porém, por causa do impacto do carma e das aflições emocionais, a natureza última foi coberta e sua face (Rang Zhal) não é vista.


O Objeto da Oração


HUM significa a essência do thögal espontaneamente realizado, a sabedoria primordial auto-manifesta. Thögal traz a visão da verdadeira face da auto-manifesta sabedoria primordial do estado de absorção luminosa espontaneamente realizada, mesmo para nós, pessoas comuns, que seguimos as instruções deste yana supremo.


Linha 1. Orgyen yul representa a luz do coração (Tsita Sha Yi sGron Ma). O corpo jovem em um vaso (gZhon Nu Bum sKu), o thig-le radiante da sabedoria primordial, habita invisível (Nub) no espaço do corpo vajra, a derradeira esfera interna (Nang Gi dByings).


Chang é a derradeira esfera externa, o espaço claramente aparente, o céu sem nuvens. Tsham, o canal das duas esferas internas e externas, é a luz aquosa dos olhos (rGyang Zhag Ch’u Yi sGron Ma).


Linha 2. Através da luz aquosa dos olhos, na derradeira esfera externa, aparece o céu puro – azul, límpido, com redes de raios de arco-íris embelezados pelo thig-le circular, como espelhos. São todos a luz da derradeira esfera pura (dByings rNam Dag Gi sGron Ma)


Então, através do acúmulo de experiência nisto, a luz da vacuidade thig-le (Thig Le sTong Pa’i sGron Ma) em vermelho – transparente, circular e límpida – surgirá como desenhos na água feitos ao atirar-se uma pedra num pequeno lago. Estas duas luzes (sGron Ma) funcionam como o chão, uma caixa ou uma casa. Elas são ambas representadas por pema (lótus).


Kesar (pistilo) representa a corrente vajra (rDorJe Lu Gu rGyud), que é o poder da atenção plena (Rig gDangs). É a essência da luz da sabedoria auto-manifesta (Shes Rab Rang Byung Gi sGron Ma) e a auto-radiância da atenção plena real, a sabedoria primordial.


Dongpo (caule) representa estabilidade da esfera derradeira (dByngs) e a atenção plena (Rig Pa) pelo confinamento do poder da atenção plena (Rig gDangs) no reino da esfera derradeira e concentrando o ponto (gNad gZhi Ba) através do modo natural livre de pensamentos da atenção plena (Rig Pa Rang Bab rTog Med). Através da experiência nestes (la) meios hábeis,


Linha 3. Conquistaremos as quatro confianças gradualmente e alcançaremos as visões maravilhosas da percepção direta da natureza última (Ch’os Nyid mNgon gSum), o desenvolvimento de experiências (Nyams Gong ‘Phel) e perfeição na atenção plena (Rig Pa Tshad Phebs). Depois disso, alcançaremos o estado de dissolução (de todos os dharmas na) natureza última (Ch’os Nyid Zad Pa) – a conquista suprema, o estado de Vajradhara – nesta própria vida.


Linha 4. Então seremos inseparáveis da Mente de Pema Jungne, que é o Buda primordial (Samantabhadra). Assim, "Renomado como Pema Jungne".


Linha 5. Apesar de não mover-se do estado de equanimidade da luz da sabedoria auto-manifesta, surgirão emanações evidentes de poder (rTsal) desta sabedoria auto-manifesta, na forma de muitos claros e móveis raios de arco-íris, thig-les, e pequenos thig-les no espaço.


Linha 6. Neste momento todos estes desenvolvimentos são o mero poder da atenção plena. Assim, contemplamos a absorção luminosa das quatro contemplações naturais (Chog bZhag bZhi) na imutável visão natural da pureza original (Ka Dag).


Linha 7. Por práticas como estas, possa eu purificar todos os fenômenos produzidos pela energia cármica às custas da sabedoria primordial para atingir o corpo vajra de arco-íris da grande transformação (‘Ja’ Lus ‘Pho Ba Ch’en Po).








O Mantra para Invocar Bênçãos


O caminho da essência mais interna da absorção luminosa é o treinamento extraordinário, pois ele medita sobre o resultado, a natureza de Buda em si, como o caminho de treinamento. Portanto, é supremo (GURU), imaculado (PADMA), e a realização suprema nesta mesma vida (SIDDHI). Fantástico (HUM)!




A Conquista do Resultado


Significado Raiz


HUM – invoca a sabedoria primordial.


1. A instrução esotérica desperta nossa própria linhagem tântrica (ogyen yul) da Mente que (kyi) transcende a condição (tsam) de se estar afundando (nub) no samsara, e dele liberta-nos (chang) através da


2. Conquista da fala (pema), mente (kesar), e corpo (dongpo) dos Budas, e (la)


3. [A sabedoria primordial da conquista] é maravilhosa (yatsen). Esta é a conquista (nye) da realização suprema (chogki nögdrub), o estado de Vajradhara,


4. que é renomado (zhesu trag) como o auto-manifesto Padmasambhava (pema jungne) absoluto.


5. Esta sabedoria tem (kor) infinita (mangpo) manifestação, ilimitada como o espaço (kha), e que age (dro) como seu poder (khortu).


6. Permaneço (dagdrub kyee) no estado realizado (jesu) da natureza sem esforços, a pureza primordial (khyekyi).


7. De forma que (chir) os fenômenos existentes surjam como a mandala dos quatro vajras (chinkyee lab), possa eu atingir (shegsu sol) a mandala do fundamento primordial.


Esta é a conquista (HUM) do caminho e da sabedoria, que é a suprema (GURU) e imaculada (PADMA) derradeira realização (SIDDHI).


Comentário


Introdução


HUM – a sabedoria primordial sagrada.


O Objeto da Oração


Linha 1. O país de Oddyana (ogyen yul) é uma fonte de tantras, e a definição da palavra Oddiyana é "ir voando". No tantra, o acordar da linhagem tântrica (sNgags Kyi Rigs Sad Pa) de nossa própria mente e a conquista da liberação do pântano das aparições dualísticas (gNyis sNang) do samsara são muito rápidos, é como voar. Pelo despertar da mente, transcendemos a conjuntura (Tsam) do samsara e do nirvana liberando-a (chang) de afundar (nub) no lodo do samsara, purificando-a de todas as máculas, e dissolvendo as aparências na derradeira esfera.


Linha 2. A conquista de todos os sons como a mandala da fala (Pema), a perfeição de todos os pensamentos como a mandala da mente (kesar), e a maturação da todas as aparências como a mandala do corpo (dongpo) – os três aspectos secretos (gSang Ba gSum) da natureza de Buda – e (la)


Linha 3. A sabedoria primordial dessa conquista, que é unidade e equanimidade, são maravilhosas (yatsen). Quando assim realizamos, atingimos a indivisibilidade do fundamento e do resultado, a conquista suprema (chogki ngödrub), o estado de Vajradhara.


Linha 4. Esta [conquista] é renomada (zhesu trag) como o Padmasambhava (pema jugne) absoluto,


Linha 5. E sua natureza é tal que não perde-se do solo primordial. Ainda assim, da sabedoria primordial, surgem (kor) infinitas (mangpo) ações (dro) de manifestações do samsara e do nirvana, tão ilimitadas quanto o céu (kha), aparecendo como seu poder (khor).


A Oração


Linha 6. Se, tendo percebido o significado da natureza e a realidade desta conquista, permanecemos aí, sem distrair-nos, assim, da mesma forma que nenhuma pedra será achada em uma ilha toda feita de ouro, todas as aparências impuras chegarão a um fim, e somente surgirão aparências primordialmente puras. Atingiremos liberação de todas as amarras do carma e das aflições emocionais. Todas as qualidades boas serão conquistadas espontaneamente e sem esforço, e atingiremos o estágio do Dharmakaya definitivamente. Assim é permanecer (daddrub kyee) no estado realizado (jesu) da pureza primordial (khyekyi).


Linha 7. Toda a existência fenomênica surge na forma da mandala de quatro vajras15 (chinkyee lab chir), as bênçãos da sabedoria primordial de nossa própria mente. Esta realização surge como resultado da conquista (shegsu sol) do fundamento primordial, a verdade última.


O Mantra para Invocar Bênçãos


Esta é a realização (HUM) do caminho e sabedoria, que é a suprema (GURU) e imaculada (PADMA) derradeira conquista (SIDDHI).





Conclusão das Práticas


A princípio, a prática da Prece Vajra de Sete Linhas como Ioga do Guru, de acordo com o significado comum, fará surgir profunda sabedoria primordial. Através do aprendizado com um Lama qualificado dos pontos cruciais dos caminhos da liberação, meios hábeis, ou grande perfeição e praticando-os diligentemente, alcançaremos confiança na realização, o resultado em si como exposto nos ensinamentos, e alcançaremos o estado de Vidyadhara (guardião do conhecimento).


Com fé inabalável, visualizamos Guru Rinpoche, a corporificação de todos os refúgios, em nossa cabeça. Rezamos intensamente a Prece Vajra de Sete Linhas a ele. Através do néctar que escorre do corpo do Guru, toda doença, carma ruim, e sofrimentos de corpo, fala e mente são limpos na forma de pus, sangue, insetos, fuligem e restos. Ao final, nosso corpo se dissolve, como sal posto na água, e o líquido desce para a boca de Yamaraja, o Senhor da Morte, e outros credores cármicos abaixo do solo. Acreditamos satisfazer todos eles e eliminamos todos os débitos. Ao final, devemos considerá-los todos como tendo desaparecido na vacuidade.


Então visualizamos nosso próprio corpo na forma do corpo radiante de uma divindade em qualquer forma que apreciemos. No coração da divindade, ao centro da lótus de oito pétalas, o Lama desce do alto de sua cabeça e unifica-se com a essência indestrutível (bindu), a sabedoria primordial. Então devemos permanecer nesta extática sabedoria primordial.


O período pós-meditativo deve ser tratado como segue: todas as aparências vistas como uma terra pura e como deidades, comida e bebida como oferendas, e as atividades de sentar e caminhar como prostração e circumbulação. Ao dormir devemos visualizar o Guru em nosso coração. Em todas as atividades diárias devemos tentar transformar tudo em praticas virtuosas, sem intervalos. É importante visualizar o Lama no céu a frente e apresentar oferendas, oferecer louvores, invocar sua mente e receber as bênçãos de seu corpo, fala e mente. Isto porque geralmente as boas qualidades dos reinos mais elevados de liberação, e especialmente o desenvolvimento da realização do caminho profundo, dependem somente da entrada das bênçãos do Guru em nossas mentes.


De forma a atingir a sabedoria primordial absoluta em nossa própria mente, devemos nos familiarizar com os ensinamentos dados nos sutras e tantras em geral, e em particular com a instrução da apresentação direta (Ngo ‘Phrod) à sabedoria primordial absoluta (Don Gye Ye Shes). E, de acordo com nossa própria experiência, realização e habilidade, devemos meditar em quaisquer dos caminhos de liberação ou meios hábeis que nos é apropriado. Ao fazer isto, alcançaremos a realização tanto dos resultados temporários quanto do definitivo.


Muitos agradecimentos a Harold Talbott por conectar-me a Tulku Thondup; a Tulku Thondup por sua clareza e gentileza e permitir que este comentário extraordinário fosse colocado na Quiet Mountain; e a Jonatham Green da Shambhala Publications pela permissão da retirada deste comentário do livro "Enlightened Journey", de Tulku Thondup. Esta página é dedicada ao benefício de todos os seres e a longa, longa vida de nossos gentis gurus raízes. Possam os Protetores Gloriosos continuamente acompanhar-nos na realização de Guru Rinpoche! – dongag tenzin






1. Retirado de "Enlightened Journey" deTulku Thondup, © 1995. Versão em inglês utilizada através de acordo com Shambhala Publications, Inc. Publicado por Buddhayana, Primeira Edição, 1979; segunda edição, 1989. Traduzido para o português por Pema Dorje em fevereiro de 1999.

2. Ou "perfeição". (N. do T.)

3. A assembléia (Tshog’ Khor) é formada por Rigdzins (Sct. Vidyadharas), Siddhas, Pawos (Sct. Dakas, Heróis), Khadromas (Sct. Dakinis).

4. AH KA SA MA RA TSA SHA TA RA SA MA RA YA PHAT.

5. Tesouros de mente ou terra.

6. Sábios e deidades: mKha' 'Gro (Sct. Dakini, do sexo feminino) e dPa' Bo (Sct. Daka, do sexo masculino).

7. As certezas absolutas de lugar, professor, discipulo, ensinamento e tempo.

8. Dang Ba'i Dad Pa: fé que limpa a mente. 'Dod Pa'i Dad Pa: fé que inspira o devoto a conquistar a mesma realização que o objeto de sua fé. Yid Ch'es Kyi Dad Pa: fé que produz total confiança no objeto da fé.

9. Sems Nyid: a natureza do absoluto e a natureza básica da mente, da qual Sems (mente) é o modo iludido. Neste texto, Mente com inicial maíuscula refere-se a Sems Nyid.

10. Sabedoria primordial da esfera do absoluto, sabedoria primordial semelhante a um espelho, sabedoria primordial da equanimidade, sabedoria primordial da discriminação e sabedoria primordial que tudo realiza.

11. Ngo Bo é aqui traduzido como "essência". Geralmente Ngo Bo, Thig Le de luz, e Thig Le (sêmen) do corpo físico poderiam ser todos traduzidos como "essência", e se torna confuso. Portanto neste texto estou traduzindo o Ngo Bo como "essência", Thig Le do corpo físico no estágio da conclusão como "essência", e Thig Le da luz de Thögal como "thig-le".

12. "Possa eu conquistar" é o significado de "Por favor venha" na oração. No texto de Mipham Rinpoche há uma citação do Pramanavarttika onde Shegs ("vir") tem o significado de "conquistar", "realizar", (rTogs).

13. A inseparabilidade de Ngo Bo e Rang bZhin, sTong Pa e gSal Ba, Ch’os sKu e Longs sKu, Guru e Padma.

14. "Animation" no original. Outras traduções possíveis seriam "energias", "vigores", "animações". (N. do T.)

15. Corpo vajra, fala vajra, mente vajra e sabedoria primordial vajra dos Budas.







Manual para a prática da meditação



A PAZ AO ALCANCE DE TODOS
(Manual para a prática da meditação)
SMRTYUPASTHANA SHASTRA
BIKKU MANGALO
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PREFÁCIO
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A Prática da Concentração (Satipatthana) é uma das práticas básicas do Budismo. O Budismo é famoso, entre a família das religiões, pela clareza da sua aproximação prática, não dogmática, na questão relativa à realização da Verdade. Não é surpreendente, portanto, quando encontramos, exatamente, no coração do Budismo, uma ênfase especial na necessidade do treinamento da mente, a fim de se atingir maior consciência e claridade. Isto é obtido atravós de recursos razoáveis e práticos, simples, que permitem manter a mente focalizada no presente. Naquilo que é, aqui e agora. Mas isto é algo mais do que simples assunto de treinamento mental ou um expediente no sentido de um “instrumento”, pois a Verdade é aquilo que é. A mente assim treinada, focalizando o simples presente diante de nós, sem a cortina de fumaça das preferências e pensamentos associados, através da qual vemos não aquilo que é, mas aquilo que pensamos a respeito dessa realidade, pode atingir algo que em si mesmo é a “porta para a Imortalidade”. Algo simples, direto, obtido na realização do incriado e, portanto, imortal. Aquela realidade que está sempre em nós, no coração do nosso Ser, oculta pelo véu de pensamentos ignorantes.
O mundo moderno, claramente, tem sede por uma nova aproximação prática, não dogmática, porém científica, para a realização das verdades perenes que qualquer um, indistintamente, sabe que existem. Mas que sentimos obscurecidas, pois não possuimos o contato pessoal, direto, com elas, em virtude de religiões dogmáticamente organizadas. Desta forma, a palavra “religião” adquire nas mentes de algumas pessoas uma associação deformada. É uma pena, pois elas voltarão em desespero as costas a essa “religião” buscando verdades para as quais somente a Religião, no seu verdadeiro sentido, pode permitir acesso. Esta sede para aproximação prática, não dogmática, pode ser saciada através simples prática da Concentração, que é na verdade o “coração da meditação Budista”.

A prática da Concentração tem uma vantagem adicional. O indivíduo, tendo adquirido o seu hábito em meditar, pode e na verdade deve praticá-lo em todas as horas através do dia, qualquer que seja sua ocupação. Não é um exercício de “meditação” limitado a ficarmos “sentados” de uma maneira formal. É verdadeiramente uma nova maneira de viver. Um intensificado estado de consciência no qual, em virtude de permanecermos no presente em vez de envolvidos num nevoeiro de fantasias, a vida será vivida mais plenamente. Longe de interferir com nossa vida e as funções do dia-a-dia, a paz e a clara consciência surgidas tornam o indivíduo muito mais senhor de si mesmo e com a cabeça mais clara nos seus julgamentos. Esta é uma das maiores glórias desta prática. Ela é aplicável em todas as horas e situações.

Estritamente falando, a Concentração não é uma propriedade exclusiva do Budismo. É a própria essência da vida espiritual, onde a religião foi tomada no seu nível mais alto. Uma atividade de tempo integral daqueles seres verdadeiramente dedicados e que são encontrados em todas as religiões. A outra alternativa é a vida de esquecimento, movida por impulso, senti-animal, com todas as suas conseqüências. O nome Concentração pode variar. Pode ser chamado Plena-Atenção, guarda do coração, atenção, sobriedade, domínio dos sentidos, viver em Samadhi, mauna, o silêncio do coração, vazio, santa indiferença, equanimidade, Samatha e Vipassana, Samadhi de Prajna, acittata, o pensamento sem suporte, morte do ego, eliminação do pensamento discursivo, visão daquilo que deve ser visto, e uma procissão de outros nomes. Todos, entretanto, vêm a ser no fim a mesma coisa. Assim como a chamada prática da presença de Deus vem a dar no mesmo, pois é somente através da concentração constante que pode mos estabelecer a consciência na mente. “É a vontade de Deus agindo através de mim. Eu sou somente o seu instrumento”, bem como método o Hua Tou do Zen, ou o método de Ramana Maharshi de perguntar constantemente: “Quem sou eu?” Todos chegaram ao mesmo lugar. É através da Concentração que podemos ver o pensamento assim que ele surge. Antes que ele siga urna cadeia de associações. Pela concentração chegamos a ver o “onde”, e “para onde” ele vai, quando o indivíduo compreende aquilo que realmente não surge nem passa. É por isso que o Buda descreve a Concentração como sendo o “único caminho”, prometendo que “a Concen tração conduz a imortalidade”, advertindo que o esquecimento é a morte”.

Embora não seja, de qualquer forma, uma prerrogativa do Budismo foram, entretanto, os ensinamentos do Buda que deram maior ênfase a prática da Concentração, bem como as mais claras restrições do como colocá-la em prática. Uma coisa é chegar a referências enigmáticas, fragmentárias, em escritos deixados por algum obscuro místico, outra, completamente diferente, e ler as claras e detalhadas descrições a respeito da prática como um tema central encontrado nos discursos da suprema autoridade dessa grande religião. Isto não é surpreendente pois, como dizia o falecido Arcebispo de Canterbury, “o cristianisnio é a mais materialista de todas as religiões”. O Budismo pode bem proclamar-se como sendo a mais prática e precisa. Nada omite que seja de valor prático e essencial. Nada acrescenta que seja de interesse puramente teórico. O Buda frequentemente desprezava discussões especulativas por não terem significação prática. Ele, por firme determinação não ensinava dogmas — mesmo que verdadeiros — para serem aceitos pela fé ou intelecto. Conduzia, em vez disso às pessoas, homens comuns, à realização direta, pessoal, da verdade através de si mesmos desde que, como todos condordam, a Verdade Última está além do intelecto. Ele preferia trazer as pessoas face a face com essa verdade através a Concentração em vez de conduzi-las pela Senda Florida da Sofisticação Intelectual.

Essa prática de Concentração, tão central no Budismo, e tratada com detalhes nos textos canônicos que registraram os discursos do Buda, particularmente no “Discurso para a prática da concentração” (Satipatthana Sutta).Há naturalmente, a usual quantidade de trabalhos comentando o assunto. Existem também vários livros escritos por ocidentais a respeito da prática. Dentre eles nota-se “O coração da meditação Budista”, pelo Ven. Nyanaponika. A prática, entretanto, é ensinada sistematicamente no Oriente, especialmente em Burma. Há uma revitalização no interesse nesta técnica tão antiga e, no entanto, eminentemente moderna que se difundiu em muitos países, entre os quais a Inglaterra.

Gostaríamos de apontar um afastamento no método de desenvolver a Concentração que aqui será exposta da maneira que é ensinada na Birmânia, onde a prática é conhecida, comumente, sob o nome de um dos seus pseudônimos — Vipassana. Na Birmânia é costume praticar a “Concentração na respiração” com a atenção colocada no movimento do abdomem durante a respiração. Isto é feito simplesmente para facilitar a observação pois muitas pessoas acham mais fácil, particularmente no começo, centralizar a atenção no movimento grosseiro do abdomem em vez da sensação do ar ao atravessar as naririas. Entretanto, não podemos negar que as descrições clássicas da prática, encontradas nos discursos do Buda e os seus comentários mais antigos, claramente indicam a face como sendo o local ideal para centralizar a atenção. Tal coisa tem gerado alguma oposição à prática como é ensinada na Birmânia, baseada na alegação de ser “uma inovação”. Muitas dessas críticas são tendenciosas e mesmo a crítica sincera tende a aumentar a importância desse pequeno detalhe além da sua proporção. Algumas pessoas tem sido mesmo desencorajadas, deixando de receber os benefícios da prática, o que é uma pena. Para desmanchar tais críticas, a respeito de detalhes menores e essencialmente práticos, preferimos frisar que no ensinamento da atenção ambas as es colas trabalham da mesma forma. Além desse pequeno detalhe a prática aqui escrita é revivida e popularizada na Birmânia sob a adequada orientação de Mahasi Sayadaw em Sasana Yeikta, Rangoon. Temos toda confíança que aqueles que a aplicarem encontrarão a mais simples e prática “porta para a imortalidade”.

‘Tende que fazer o esforço. Os Budas mostram o caminho”.
Centro de Meditação Budista-Biddulph.




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PRÁTICA DA CONCENTRAÇÃO — O MACACO LOUCO
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A melhor maneira de começar é ver onde devemos começar. Olhemos a mente de uma pessoa comum. Mundana. O que encontramos é a mente-gafanhoto, a mente-borboleta, caçando suas fantasias e impulsos do momento.Uma simples presa de estímulos e reações emocionais. Reações que são largamente, permanentemente condicionadas. Cegas. Uma cadeia de associações unidas, esperanças, medos, memorias, fantasias, lamentações, jorrando constantemente através da mente. Desencadeadas pelo contato momentâneo com o mundo externo dos sentidos. É uma busca cega, incessante, insaciável, por satisfação. Sofrimento sem finalidade e confusão. Isto não é realidade, mas um sonho desperto, uma sequência de conceitos e fantasias. O mundo está subdividido em inúmeras formas identificáveis, reconhecíveis. Cada uma delas tem seu nome e na base destes nomes, — imagens conceituais da realidade em nossa volta — a mente tece o manto do pensamento no qual termina se embaraçando. Os objetos mudam, mas seu “nome” permanece o mesmo. A mente aferrada a nomes vazios e imagens, perde ocontato com a realidade ao tentar encontrar, nos produtos de sua própria imaginação, a satísfação e segurança que anseia. Não admiraque a mente tenha sido chamada “a fábrica da ídolos”. Não admira também que o Buda a tenha descrito como um macaco inquieto, de galho em galho, em busca do fruto que o satisfaça através da infindável selva de eventos condicionados. A futilidade, a irrealidade e frustração, inerentes a tal modo de existência, é tão auto-evidente quando o indivíduo principia a ver claramente. A finalidade do Budismo, e da religião em geral, é reunir o indivíduo com a realidade que perdemos de vista devido nossa ignorância ao buscar a felicidade que ansiamos ou de não é encontrada: — nas sombras e ilusões de nossa própria mente. Uma das maravilhas paradoxais desta nossa época, que gosta do autocognominar-se “científica”, é o fato de o homem moderno deixar sua mente continuar essa cega e atormentada corrida de rato numa confusão indisciplinada.. Ao longo do tempo o homem acumulou uma quantidade fenomenal de informações — conceitos — acerca de nomes e formas que habitam no Universo e controlou, disciplinou as forças da Natureza que teriam destruído seus avós. Para obter energia elétrica construiu estruturas de tamanho e custo enormes à custa de dinheiro e trabalho, barrando grandes rios e correntezas. Entretanto, sua própria natureza o ilude. O conhecimento da realidade lhe escapa e ele, inexplicavelmente, não faz o menor esforço pa ra disciplinar seus próprios pensamentos. Mesmo quando começa a perceber a maneira que eles o iludem e atormentam.
Uns poucos, através de incontáveis gerações, nadando contra a correnteza dos mo deles humanos, desempenharam essa tarefa. Sofreram com isso inúmeras privações, desencorajamento, quando no inicio, às cegas e sem instrutor, tentaram achar o Caminho. Alguns conseguiram triunfar, outros tropeçaram com inúmeros sofrimentos, todavia todos, no final, declaram, em línguas diferentes, que encontraram “algo”. “Algo” que uma vez encontrado permite que se conheçam todas as coisas. É o Incriado, a única Realidade perdurável. O nosso próprio Ser e sua “descoberta” é, todos concordam, a suprema felicidade ao lado da qual todo o sofrimento de idades subitamente se torna completamente insignificante. E, de uma forma estranha, mas certa, todos que encontram esse “Algo” encontram o estado além da vida e morte. Algo além dos sentidos, embora nele resida o poder através do qual vemos, ouvimos e pensamos. Esse “Algo” está velado pelo fluir de pensamentos ignorantes que nos impedem a visão do que “é” que nos deixam ver somente aquilo que pensamos a seu respeito. É a velha história do homem que vendo um pedaço de corda dependurado numa árvore, com pouca luz, considera-a como se fosse uma serpente e entra em pânico. Desta forma as coisas ocorrem.. Tomamos nossos pensamentos, meras imagens da realidade, pela própria realidade permitindo que emoções sejam estimuladas por eles. As emoções, por sua vez, produzem mais pensamentos no desejo de satisfazer a perturbação e, assim, o círculo vicioso se completa. O fato é que não podemos pensar a respeito da realidade se não a conhecemos. Sem o jôrro dos pensamentos não haverá emoções perturbadoras. A mente estará em paz não havendo, então, necessidade de pensar.




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A PARALIZAÇÃO DO PENSAMENTO CONCEITUAL
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O primeiro passo, portanto, e cortar a cadeia de conceitos e palavras associados que inundam nossa mente. Devemos sustar nova invasão mantendo a Concentração no presente, naquilo que é. O Buda, num verso famoso assim costumava falar:
“Não corras atras do passado,
Não busques o futuro.
O passado, passou.
O futuro ainda não chegou.
Vê, claramente, diante de ti o Agora,
quando tiveres encontrado
e viveres o tranquilo e imóvel estado mental”.

Este é o começo de uma disciplina mental e o recordar para assim agir é Concentração. Sem esta Concentração o jôrro de pensamentos principia novamente, agitando, nos entristecendo e maculando a mente como a água lamacenta de om lago no qual o vento forma ondas. A claridade da visão, paz da mente, e autoconcentração serão perdidas num simples instante. Por essa razão o Buda chamava a Concentração “o único Caminho”. Um caminho que ele precisamente descrevia numa metáfora:

“Quaisquer que sejam as correntezas fluindo no mundo, a Concentração é a barragem que as retém”.
Quando o “rio Jordão” é barrado, o “povo escolhido” cruza-o de pés secos até a “Terra Santa”. Ou como é dito no Zen:
“A mente louca não pára. Se parar, é a Iluminação”.
A prática da Concentração é um treinamento gradual. A perfeição na autoconcentração é a “Arte das Artes”, a “Ciência das Ciências” para a qual um aprendizado adequado é necessário, O treino de nossa própria mente — (“nossa” nos devidos termos) — é mais duro do que o treinar um cão ou cavalo pois a mente não é menos forte e possui, além disso, todos os truques e ingenuidade humana para encontrar o caminho, a fim de ficar sem controle. Todavia este é um treino valioso, trazendo em si, já nos primeiros estágios, grande paz e alegria e inúmeras riquezas no curso de treinamento. Há pouca esperança de obter a felicidade com uma mente voluntariosa e não concentrada — mesmo que seja a simples felicidade de uma vida pacífica, com finalidade e equilibrada. Como podemos esperar então alcançar o supremo objetivo da vida?

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QUE CONCENTRAÇÃO?

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Mas o que é prática da Concentração? Como nos situar em relação a ela? Concentração é simplesmente o estabelecimento da atenção, com plena consciência, no aqui e agora. É o “pensamento sem suporte”, a “mente veloz” e o verdadeiro “silêncio Ariano”. À medida que cada objeto surge na consciência através das seis entradas (os cinco sentidos e a imaginação) deve ser visto como ele é sem dar boas vindas ou re jeitar. Sem nos aferrarmos a ele ou tentarmos pô-lo de lado. Mas, simplesmente, deixando-o como “se ele fosse um pedaço de madeira podre”, como o grande Huang Po costumava dizer. Esta é a verdadeira significação do “Caminho do Meio” do Budismo: — ver cada um (e todos) objetos assim como eles surgem, com a mente “alerta”, plenamente consciente evitando seja o apego ou a aversão a qualquer coisa. Isto é: — “não desgostes e tudo claro se tornará”, O Buda costumava definir a Concentração da consciência como ver o surgir, a presença e o passar de todas as percepções sensações e pensamentos. “Ele inúmeras vezes costumava dizer que seus ensinamentos, em resumo, “eram”: veja somente o visto naquilo que se vê e ouça somente aquilo que se escuta nas coisas ouvidas”! É tudo a mesma coisa.
Mas quando tentamos fazer isso que encontramos? Vemos que, primeiramente fazer isso, mesmo por poucos minutos, é completamente impossível. A mente é varrida por uma verdadeira correnteza de pensamentos em erupção (ASAVA) e uma inquietação que torna impossível sermos claros e detalhados bastante para evitar reações aos pensamentos e objetos que surgem. O indivíduo nem pode começar: É por essa razão que o Buda em sua sabedoria, compaixão e “perícia nos meios” ensinou a “Prática da Concentração” como o método gradual de treinamento através o qual, de um caos inicial e confusão de uma mente indisciplinada, e com a vontade de um touro, ela pode deixar de “cultuar estranhos deuses” e tornar-se tranquila e conhecendo, por fim, AQUILO QUE É.



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BASES DA CONCENTRAÇÃO
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Em primeiro lugar, uma palavra de advertência. O “‘Samadhi” adequado, ou a tranquilidade mental, o último passo na Nobre Senda Óctupla do Buda que leva à realidade, é somente possível com a correta Concentração. É o passo que conduz a ela. De modo semelhante esta Concentração depende dos passos precedentes, isto é: da Compreensão Correta, Moralidade e Determinação. Tem que haver pelo menos uma boa base para a Compreensão a fim de entendermos a futilidade do transitório e do condicionado à luz do Não-condicionado e de todos os objetos quando o indivíduo está olhando para “si” — o sujeito. A mente não poderá se libertar o suficiente do pensamento a respeito de objetos em constante mutação a não ser através da prática da autoconcentração no aqui e agora. Ela quererá paralisar o pensamento a respeito dos seus ídolos pois, onde estiver, nosso tesouro (Ratana) estará e, também, o nosso coração (Citta). De maneira semelhante a não ser que tenhamos uma boa base numa atitude moral para a vida, a Concentração será construída em areia. Uma consciência má é como a água turva que impede a visão clara da “coisa como ela é”.
Sem paz na mente há pouca esperança na paralisação do fluir dos pensamentos apesar que tenhamos toda a determinação do mundo. Mesmo assim é quase impossível. Naturalmente nenhum de nos é perfeito — longe disso — todos fracassamos deixando de viver a vida que sabemos certa. Mas, a não ser que coloquemos em ação um esforço sincero para viver os preceitos básicos Budistas, estaremos acelerando e freando ao mesmo tempo. Mais tarde uma crescente autoconsciência e paz trarão maior autocontrole. Mas pelo menos uma sincera vontade e esforço para o bem deverá existir e sincero arrependimento (e se possível restituição) por qualquer mal feito. Acima de tudo a mente tem que começar a afastar-se dos modelos antigos. Este é o verdadeiro significado do “arrependimento” — (metanoia).



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UM CURSO DE CONCENTRAÇÃO
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A melhor maneira para aprender a Prática da Concentração é tomar um “curso” sob a direção de um instrutor competente. Nesse caso, devemo-nos colocar, sem reservas, nas suas mãos e seguir a prática, exatamente, como for recomendada.
As instruções que se seguem destinam-se somente para referência e guia básica quando sentimos a necessidade de seu uso. E também para aqueles que, por qualquer razão, não puderem praticar sob a orientação de um instrutor, mas que desejarem fazer um esforço por si mesmos. Com um instrutor as dificuldades são muito reduzidas, pois ele poderá testar o progresso através de relatos diários, corrigindo qualquer perigo nascido da incorreta aplicação dos princípios da prática. É de grande auxílio o sentimento de confiança produzido pela prática sob a direção de um instrutor, mesmo que seja por um curto período. Muitas pessoas sentem que a entrevista diária com seu instrutor aplaina dificuldades específicas, agindo como uma espéie de “recarga” nas suas baterias de imaginações e determinações. Sentir que as coisas não estão indo bem não é necessariamente uma prova de que elas estão indo mal. Na verdade pode ser o sinal de progresso pois pelo menos a pessoa esta começando a ver a forma errada como está sendo feita a prática. Em outras palavras, começamos, por fim, a ver as coisas com mais claridade. Apesar disso podemos subjetivamente não ter consciência no momento e nos alegrar quando, a pós descrever um quadro negro a respeito das dificuldades em controlar a mente, ver o instrutor sorrir com prazer e, quase esfregando as mãos, dizer: “Ah! Agora as coisas estão melhorando!”

Com sua experiência ele poderá dizer como as coisas vão indo, inúmeras vezes por detalhes mínimos insignificantes. A melhor atitude, portanto, e confiar na sua experiência e julgamento, contando-lhe todos os detalhes a respeito do que está ocorrendo. Um contínuo comentário, feito para reforçar o próprio progresso, é um grande obstáculo ao verdadeiro progresso. Algumas pessoas tem a tendência de contar ao instrutor somente o que gostariam que lhes tivesse acontecido em suas práticas. Omitindo detalhes das dificuldades e fracassos que consideram não deveriam ter ocorrido — usualmente devido ao orgulho e na vã tentativa de se iludirem pensando que as coisas estão indo melhor do que na realidade. Esta atitude não é sábia. O instrutor necessita saber o lado bom e mau da prática, ele é o melhor juiz a respeito do que é ou não importante. Inúmeras vezes pequenos detalhes são de enorme importância para ele aquilatar o progresso do praticante.

Outra fraqueza, muito encontrada entre os Ocidentais ao praticarem a meditação, sob um instrutor, é o desejo de saberem mais a respeito da “teoria”: a respei to de “como as coisas vão!”.

Desta forma, eles se enchem de perguntas e objeções desnecessárias que brotam de pensamentos. Como vimos, o pensar é o oposto da prática da Concentração. A teoria deve ser posta de lado nesta ocasião. A melhor coisa é fazer o que manda o instrutor. Como num Império, sua decisão deve ser final. Ligado a esta questão está a preocupação Ocidental com o conceito da Psicologia “o tornar consciente o inconsciente” e outros. Com essa preocupação muitos começam a “olhar” para “erupções no inconsciente”, aos problemas apresentando-se para solução, e por aí afora. Deve-se frisar que a análise psicológica não é parte da prática da Concentração. A única finalidade é ver mais claramente, sem a interferência do pensamento discursivo, aquilo que É, em cada momento, Agora no presente. A meditação é tranquilização da mente e a observação do que É desapaixonadamente.Sem nenhum pensamento — não “eu”, nem “meu”, nem neurose. Da mesma forma que a mente se refresca no sono, ou quando a terapia ocupacional é aplicada ela se afasta de suas preocupações, ou quando um dedo cortado é limpo e deixado curar-se pela ação da Natureza, nossa mente melhor se curará pelo repouso, pela limpeza de estimulantes emocionais e preocupações. Nada nos afeta tanto quanto a prática da Concentração. Se continuarmos a prática chegaremos a ver a irrealidade do conceito do “eu” e com isto destruiremos as bases de todas doenças mentais e tristezas. Não há qualquer recurso, nem modo de ver as coisas, nem tentati vãs para tornar consciente o inconsciente que liberem o indivíduo, por exemplo, de sua “insegurança”, enquanto ele estiver afirmando “eu”, “eu”, corpo e mente nos quais ele busca a segurança. Eles são impermanentes e nenhuma manobra alterara este fato ou permitirá segurança. Entretanto, logo que cair a idéia do “meu” no corpo, todo o problema desaparece. Por esta razão, durante a prática da Concentração, devemos por de lado pelo menos, a análise psicológica. O “eu” constantemente pensando em si mesmo é o problema — não suas preocupações, e nem as formas que toma. A necessidade Ocidental de intelectualizar a respeito da própria prática de meditação é uma das razões principais porque os Ocidentais usualmente demoram mais tempo e acham mais difícil do que os Orientais, um curso de Meditação. Muitos Orientais simplesmente submetendo-se a orientação do instrutor completam o curso em poucas semanas. A maioria dos Ocidentais costuma levar o dobro do tempo.



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PASSOS PRELIMINARES NA PRÁTICA DA CONCENTRAÇÃO
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Particularmente aqueles que estão iniciando um período de pleno treinamento num curso de Concentração deverão, sabiamente, tomar algumas providências, a fim de que sua prática não seja interrompida. O ideal seria a pessoa poder tomar um curso completo, sob instrução adequada, durante um período de tempo indefinido. Em outras palavras: até que o instrutor fique satisfeito ao verificar que plenos benefícios do curso foram obtidos. De outra forma, os pensamentos a respeito da aproximação da época da partida e a sensação de que devemos ter tudo terminado nessa ocasião podem ser obstáculos de monta para quem medita.
Na prática, entretanto, não é sempre possível dispor de um período de tempo indefinido, especialmente nas condições desfavoráveis da cultura Ocidental e na necessidade de atividades para ganharmos a vida. Ainda assim, mesmo em tempo limitado, a prática dará lucro, se feita com resolução e espírito correto, pondo de lado os pensamentos de “por quanto tempo terei que praticar?” e outros semelhantes.

Sempre que possível, a pessoa deve antes da prática por em ordem sua vida. De outra forma, coisas como, negócios, preocupações financeiras, aborrecimentos familiares, respostas de cartas, etc., causam distrações. Durante o período de meditação, devem ser postos de lado todos os pensamentos que nao estejam ligados à meditação, isto é, ao Aqui e Agora

Durante o período de meditação, devemos tentar viver uma vida a mais simples possível, cortando dela fantasias e arrebatamentos desnecessarios. Gastar horas e horas lavando e pasando vestidos de fantasias e aplicando cosméticos não conduz à boa meditação. Na verdade, a maioria dos praticantes deverá, sabiamente, tomar os “8 preceitos”, como o fazem os Budistas Orientais, nessa ocasião. Eles nos levam à renúncia (ao menos temporária) de coisas, tais como: distrações, diversões, uso de cosméticos, perfumes, vestimentas elaboradas, etc.

A sofisticação no vestir e na apresen tação, quando vistas com a devida nitidez, são recursos que a mente utiliza para encontrar uma sensação de segurança e nos convencer de que somos atraentes e belos. Mesmo sem essas distrações, a mente estará bastante irrequieta e em certas ocasiões ansiosa por encontrar “Algo”, em vez de fazer o que lhe parece ser “nada”.

O melhor e deixar o futuro para o futuro (Provavelmente ele nunca ocorrerá!)! O passado deve ser deixado para o passado!
A mente é muito seletiva a respeito do que ela deseja lembrar do passado. Da mesma forma devemos evitar toda a conversa e leitura desnecessarias, bem como andar sem finalidade. Uma boa norma a tomar no período de prática é: “Coma menos, durma menos, converse menos, medite mais”. Após uns poucos dias na Prática da Concentração, verifica-se que necessitamos menos horas de sono. A razão disto é o cérebro, o grande consumidor da maioria de oxigênio do sangue, que é queimado em energia emocional e tensões que nos assolam e perturbam física e mentalmente. Tudo é devido à enorme quantidade de pensamentos carregados de emoção que a mente está naturalmente tratando. Quando isto é cortado por uma maior autoconsciência na Prática da Concentração, alcança-se uma Paz e liberdade do constante emocionalismo. Com isto a mente repousa e é Curada, necessitando, portanto, de menos sono. Uma regra geral seguida nos mosteiros do Oriente mostra a possibilida de de cortar para 4 as horas de sono e, logo a seguir, para duas apenas. Eventualmente é muito comum encontrarmos pessoas que durante dias e dias, ou mesmo semanas. permanecem sem dormir 24 horas mergulhadas em meditação ininterrupta. Apesar disto não tem cansaço nem mostram qualquer efeito maléfico e apresentam um bem-estar e acuidade até então desconhecidos. Para atingir este estado é necessário real dedicação à prática pelo menos no período em que é praticada. É apenas o início de uma série de experiências individuais perfeitamente compatíveis para pessoas que são “homens do mundo”, com um emprego, uma família para zelar e funções da vida a atender. Acima de tudo, devemos manter nossa vida simples, evitando neste período conversas desnecessárias, a não ser com o instrutor, e todas as leituras. Conversas externas tendem a se prolongar na forma de conversas imaginárias.



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EXERCÍCIO BÁSICO DE RESPIRAÇÃO
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Com essas preliminares e atitude correta da mente, a melhor maneira para começar a Prática da Concentração é, como o Buda claramente discorreu no “Discurso à Resposta da Prática de Concentração” (SATIPATTHA NASUTTA). Devemo-nos sentar e estabelecer a atenção na mais sensível e constante função do corpo — a respiração. Ela é uma função semi-automática (SANKHARA) sempre presente em nós na vida normal e completamente neutra do ponto-de-vista emocional. Por estas razões, é o objeto ideal para aprendizado. O indivíduo deve-se concentrar e suster sua atenção naquilo que está ocorrendo, no agora, no presente, no aqui. Muitos acham que a melhor maneira e sentar de pernas cruzadas. Não necessita, entretanto, ser na famosa “posição do lotus” com as plantas dos pés voltados para cima, nas coxas opostas, nem mesmo na posição de “semi-lotus” que produzem em muitas pessoas dores intensas.
A posição simples, “fácil” com as pernas repousando semicruzadas no chão é perfeitamente suficiente. Podemos colocar para ajudar um travesseiro estrategicamente, localizado sob um joelho que nos perturbe.

Se não pudermos ficar sentados de pernas cruzadas, paciência. Isso não é de grande importância. Hoje em dia muitos instrutores de meditação orientais fazem sua meditação sentados numa cadeira. A única importante consideração é que devem ter urna postura ereta, alerta, com a espinha reta que possa ser mantida sem sofrimento durante mais ou menos uma hora. Enquanto praticamos devemos ficar sentados, imóveis, e relaxados mas plenamente em estado de alerta. As mãos podem ficar na posição usual, representadas nas estatuetas do Buda em meditação ou simplesmente uma sobre a outra, apoiadas na parte superior das coxas. A cabeça deve estar ereta, com os olhos fechados e todos os músculos relaxados na medida do possível. A posição, uma vez estabelecida, deve ser mantida, evitando-se reajustamentos desnecessários na postura.

O local adequado para a concentração da atenção é a face. Isto varia ligeiramente de pessoa para pessoa. Alguns acham o melhor ponto uma zona localizada acima do lábio superior. Outros a ponta do nariz. Não importa. O que importa é que cada um encontre o local onde a percepção da respiração seja mais nítida. Algumas respirações experimentais permitem estabelecer esse local em pouco tempo. A atenção deve estar focalizada na sensação física produzida pelo toque do ar não no conceito da respiração. Não devemos também interferir com a respiração que deve fluir normalmente. No começo é um pouco difícil e nos estágios preliminares não é fãcil dissociar a pura atenção, do controle. Entretanto, neste caso devemos tentar evitar, de qualquer forma, o desnecessário e não-natural controle da respiração. Devemos respirar naturalmente, no rítmo normal, com a mente focalizada na sensação do toque do ar nas narinas. No começo pode parecer difícil a percepção clara da passagem do ar. O seu “toque” nas narinas. Continue sem dar importância! A prática e persistência em muito melhorará isso. Devemos tentar ficar consciente da sensação do ar desde o momento que se inicia a inspiração até o seu término e novamente do início da expiração até seu fim. Quando inspiramos devemos mentalizar a palavra inglesa “in” (dentro) Quando expiramos devemos repetir mentalmente a palavra “out” (fora). Este é um recurso para testar se a mente está fazendo a prática em vez de sonhar acordada.



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DISTRAÇÕES
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Se uma pessoa não tiver meditado por algum tempo, ela terá constantemente sua mente afastada da observação na respiração. Pensamentos e memórias do passado, esperanças e medo do futuro, imaginações fantasias, intelectualizações da teoria, dúvidas e aborrecimentos acerca de sua meditação, cenas e formas que surgem diante do “olho” mental, distrações produzidas por estímulos externos, tais como ruídos, dores, coceiras, impulsos para se movimentar, etc. Todos eles tendem constantemente para deslocar a mente levando-a “assuntos laterais” interessantes. Não há necessidade de nos aborrecer ou ficar desencorajados com isso, pois a mente funciona da forma com que se habitou há longo tempo. A disciplina começou faz pouco tempo. Roma não foi feita num dia. Além do mais se fôsse fácil governar a mente encon traríamos homens iluminados em quantidade. O Buda nos disse que a mente quando começa mos a querer retirá-la dos seus hábitos maléficos e como um peixe retirado das águas e colocado nas margens. Agora sentimos as dificuldades na prática. Não devemos desaninar. Todos encontram ou encontraram essas mesmas dificuldades. Os homens iluminados são aqueles que não desesperam, perseveram, mantendo a mente sob controle da mesma forma que um cachorrinho exuberante é paciente, mas firmemente, treinado a obedecer. Aqui, como em todas as partes, devemos tentar trilhar o fio de navalha do Caminho do Meio. Deve haver a determinação para continuar mas uma determinação calma não aquela que se move em arrancos e paradas entre os pólos do fanatismo e desespero. Isto mostra um forte ego envolvido na questão (Eu desejo ser um bom meditador). Uma determinação não tensa é o que se necessita — ou como os comentadores clássicos do Budismo descreveram, um equilíbrio perfeito entre a paz (SAMADHI) e Ener gia (VIRIYA). Esses dois, assim como a discriminação (PANNA) e fé (SADDHA), devem estar em perfeito equilíbrio.
A maneira para tratar essas distrações e noticiar imediatamente, ou pelo menos tão cedo quanto possível, o fato da
existência da distração identificando-a com a palavra adequada tal como: “pensar, “ouvir”,“ver”, “dor”, “coceira” ou “impulso”. A seguir a mente deve voltar a sua ativida de adequada prestando atenção a sensação da respiração identificando a inspiração com um (in) e a expiração com um (out) até a próxima interrupção por nova distração. Proceda sempre da maneira descrita. Quando há qualquer sentimento de irritação na distração ela deve ser qualificada como “Irritação” claramente identificando com uma etiqueta o tipo de sensação em causa. Após isso a mente deve voltar a prestar atenção na respiração. De maneira semelhan te qualquer divertimento — ou por exemplo o prazer sentido com a velocidade com que captamos e registramos um movimento centrífugo na mente — deve ser qualificado como “diversão” ou “prazer” e novamente voltar a atenção para a respiração. Todas as tendências para a mente peregrinar devem ser anotadas tão cedo surjam. Quando o indivíduo tiver mais prática pode capturá-las antes que elas nasçam pois ele antecipa-se a mente, que começa a se movimentar em determinada direção. Não devemos, entretanto, saltar sobre ela tentando a sua imobilização. A identificação do estado mental não deve ser nem muito rápida, nem vagarosa de mais, mas sim, firme e claramente sem superprodução. Quando nos preocupamos demasiado isto só serve para maiores agitações e distrações mentais. Tal fato está muito bem dito na afirmação: “Não há necessidade de ter medo dos pensamentos que nascem e sim da demora em nos tornar conscientes de les” . O perseverar pacientemente na captura dos pensamentos como quem traz de volta a determinação da posição um cachorrinho que está sendo treinado toda vez que ele escapulir, e na verdade meditação e indica que as coisas vão indo muito bem. O que não é meditação é o indivíduo tornar-se preguiçoso e ficar sentado, imóvel, sonhando acordado, como tambêm deixar-se tomar pelo aborrecimento e desespero ao ver que a mente não para.

Outra forma de grande distração são os “comentarios pensados” tais como os pensarnentos: “Bem, neste momento não estou pensando em nada”, ou “As coisas estão bem agora” e outros semelhantes. Inúmeras vezes eles tomam a forma de relacionar o que vamos dizer ao instrutor e imaginando, com antecipação, toda a conversa. Esses pensamentos devem ser simplesmente notados e rotulados como “Pensamentos” e como o Ven. Mahathera a Huang Po disse: “deixados de lado como um pedaço de madeira podre”. Convém notar que devemos deixar de lado em vez de jogar fora. Um pedaço de madeira podre nada está fazendo para te irritar. Não tem qualquer utilidade, dai não devemos nos aferrar a ele. O Buda usava a mesma descrição ao afirmar que todos os objetos (DHAMMA) da mente não são “meus” nem nada têm a ver “comigo” (Como poderiam ter? São somente objetos e não sujeitos). Não tem, portanto, qualquer significação como também não têm as folhas e galhos caídos no solo de uma floresta. Por que preocupar­mo-nos com eles? Qual a vantagem em investigar o lixo que acumulamos para logo o jogar fora? Ao notificarmos todas essas distrações, bem como a própria respiração, as palavras usadas como identificação, tais como “in”, “out” são somente etiquetas, rótulos, para maior qualificação. A finalidade é, em cada caso, obter unia visão clara, em foco, do objeto em questão. Se nos movimentarmos sem cuidado, com a atenção fora de foco, ou com a consciência mais na palavra do que no objeto não o veremos, obviamente, com maior nitidez. Pelo contrário, se nos aferrarmos fortemente a ele isso perturbará a mente e produzirá mais pensamentos. Novamente convém lembrar que é necessário, seguir o caminho do meio. É por esse motivo que constantemente é repetido no “Discurso Para a Prática da Concen tração” que devemos ficar conscientes do objeto com “a concentração estabelecida” somente o suficiente para uma clara compreensão e autoconcentração, enquanto permanecemos desapegados a tudo deste mundo. Não existe qualquer necessidade para tentar restabelecer ligações numa cadeia de pensamentos associados, nem tentar apurar o que primeiro produziu essa cadeia. Qualquer impulso dessa natureza deve ser notado simplesmente como “pensar” e a mente deve voltar a prestar atenção na respiração. Entre tanto, se coisas más nos perturbarem devemos, imediatamente, recomeçar o processo de atenção interrompido no único lugar onde é possível — naquele em que estamos agora e continuar daí em diante. A análise psicológica é também rotulada como “pensar”. Movimentos involuntários do corpo e membros durante a prática devem ser notificados da maneira apropriada como “sacudir”, “movimento”, etc., e a seguir a mente deve voltar a atenção para a respiração. Verifica-se que, normalmente esses movimentos, bem como dores, coceiras, desconfortos, cessarão quando notados clara e impessoalmente. Particularmente no início verifica-se que não param imediatamente sendo necessário notificar essas distrações por duas ou três vezes, as vezes mais, antes que desapareçam. Em certas ocasiões, dores, coceiras, caimbras, dormências, tem urna tendência em aumentar de intensidade quando uma atenção concentrada é focalizada nelas. Mas se a pessoa continuar a notâ-las, sem paixão, todas as vezes que a mente for atraida elas começarão a desaparecer. Por essa razão se uma sensação parece aumentar em vez de decrescer, devemos continuar a notá-la com a atenção clara, sem emoção, focalizada na sensação atual (real) e não da idéia da sensação; nem na aversão ou medo da dor. Ela então desaparecerá ou estabilizará. Em primeiro lugar quando o indivíduo não está plenamente consciente dessa forma, quando lhe ocorre uma sensação, nasce também o desejo de que ela desapareça. Isso é mecânico. Nesse mecanismo a mente torna-se atenta, dentre todos os possíveis objetos em determinado momento, de um que a mente está interessada, O interesse é de duas espécies: contra e a favor. Gostar e não gostar são igualmente sinais para a mente trazer um objeto para posterior investigação. Essa é a razão porque o Caminho do Meio — entre o gostar e não gostar é necessario. Quando olhamos desapaixonadamente, com equanimidade, a qualquer coisa apresentada pela mente vemos que: “meu caro, aquilo não tem o interesse que pensei que tivesse”, e com isso ela abandona o que parecia interessante e passa para outro assunto. O mesmo ocorre com pes soas. Se alguém vem para te ver e o recebes com afeição ele ficará para uma longa conversa. Se pelo contrário receberes o visitante, com agressividade e irritação é quase certo ele ficar para discutir contigo. Quando, entretanto, o recebermos correta mas friamente, evidentemente não interessados na vinda, o visitante importuno irá embora. Portanto, uma equanimidade genuína a todos os objetos apresentados pela mente produz cedo a paralisação de suas influências incluindo nisso as dores e desconforto. Mas a mente não se engana. A equanimidade deve ser genuína, ou a mente começará a trabalhar imediatamente.



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MOVIMENTOS
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Nos estágios iniciais, quando uma dor ou coceira não desaparecem, mesmo depois de repetidas notificações, mas pelo contrário, se tornam intoleráveis ao ponto de obrigar a pessoa a se mover ou coçar o ponto da pele onde elas atuam, o indivíduo deve qualificar essa vontade como: “intenção”. A seguir, voltar novamente a atenção para a respiração. Se, apesar de ter seguido todo o esquema, notar a dor, a coceira e o impulso de se mover ou coçar como “intenção” e tiver mesmo que se mover por não suportar mais a sensação, deve fazer o necessário movimento, qualificando cada etapa. Por exemplo: se uma coceira na testa tiver atingido as proporções de um martírio e os repetidos impulsos para nos movimentar, qualificados devidamente como “intenção”, tiverem sido impotentes para controlar a sensação, devemos lenta e deliberadamente começar a levantar o braço, e enquanto fizermos esse movimento contínuo, repetir mentalmente: “levantando, levantan do, levantando...” a fim de assegurar a perfeita concentração da mente no movimento.
Quando a mão alcançar a testa o toque da unha deve ser notificado como “tocando” e ação de coçar como “coçando, coçando...”. Quando a sensação provinda da testa indicar que a coceira está satisfeita, devemos imediatamente registrar: “satisfeita”, O impulso para recolocar a mão no colo deve ser identificado como “intenção” e o longo e lento percurso como: “movendo, movendo...” e por ai adiante. Esta descrição um esquema geral da coisa, mas, de fato quando tivermos alguma prática nessa técnica, encontraremos muito mais coisas a notificar nesta simples ação de coçar a testa. Um som pode distrair a pessoa no momento que começa a elevar a mão, ou um pensamento. Podemos ter nossa atenção distraída pela modificação da pressão no nosso regaço ou no antebraço. Quando, num momento de perda de concentração, começamos um movimento “cego”, não registrado préviamente, a coçar a pele ou qualquer coisa que envolva um movimento, devemos imediatamente nos reconcentrar, vendo o que estamos fazendo, registrando: “movendo” ou “coçando” e principiar novamente deste ponto em que “estamos”. O que passou, passou, e não ganhamos nada em nos insultar, nem arrebentar em lágrimas, apesar de toda ação provinda de impulso cego, sem registro, seja um sinal de distração e portanto, em outras palavras, um fracasso na Concentração. O Buda assim nos indica no “Discurso Sôbre a Prática da Concentração” ao dizer: “seja dobrando um braço ou esticando, devemos agir com plena consciência”. Isto é o que significa Concentração: — prestar atenção naquilo que estivermos fazendo, vendo as coi sas “como elas são ...“ não aquilo que estamos pensando a respeito delas”.

Quando estas ações forem terminadas, a atenção deve reverter novamente para a respiração. A descrição acima de como considerar uma coceira concentrando-se, é apenas um dos inúmeros tipos. Todas outras ações para nos mover, se absolutamente necessárias para aliviar uma dor, engulir, esticar o pescoço, abrir e fechar os olhos, — todas as ações enfim, devem ser tratadas da mesma forma. Esta é a Concentração, a maneira “direita”, o único “caminho”.



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DORES E MAL-ESTARES

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Certas ocasiões durante a prática surgem dores, coceiras, compressões, sensações de dormência, alfinetadas, sensações de que um inseto está andando sobre a pele, e outras. Elas podem tornar-se proeminentes. Não há razões para preocupações (ou interesse), pois isso não é sinal de doença. As sensações brotam de um enorme número de causas naturais. Algumas estão em nos o tempo todo, mas “normalmente” não somos conscientes delas. Isto pode ser visto se observarmos a maneira que “pessoas ignorantes, mundanas” mudam constantemente de posição sem a menor consciência do desconforto como sendo a causa dessa mudança. Vemos, portanto, como é profundo o descontentamento “DUKKHA”: a nobre verdade do sofrimento : Mesmo modificar a posição como as pernas estão cruzadas é um sinal disso. Se estivéssemos satisfeitos não mudaríamos de posição. A maioria das sensações que cos tumam ocorrer na meditação são devidas aos períodos prolongados, a que não estamos acostumados em que ficamos quietos sentados enquanto a mente e músculos estão ainda tensos, lutando contra si mesmos, não tendo alcançado ainda o estado de relaxamento (PASSADHI). Uma grande paz mental traz sempre consigo um maior relaxamento nervoso e muscular, eliminada a causa do desconforto. Mas por algum tempo, enquanto isso não ocorre, temos que suportar concentradamente e sem revolta os efeitos acumulados. Outras sensações são psicossomáticas ou produzidas pela mente condicionada durante anos de saltitante atividade, pulando de um tópico “interessante” para outro como um gafanhoto sem se preocupar da realidade do objeto. Desacostumada, portanto, a prolongada atenção a coisas tão desinteressantes e monótonas como a nossa respiração, a mente se aborrece e tona se inquieta criando diversões para sua própria distração. É “MARA”, em ação, o princípio do Mal, tentando que abandones o interesse na Prática da Concentração. Entretanto, como tem sido descrito, se os truques da mente forem prontamente identificados, simples e sem emoção, como: “coçando”, “sentindo”, etc, MALA nos deixa e vai embora: Da mesma forma que as suas três filhas quando fizeram tudo para tentar o Buda que firmemente recusou-se a reagir de uma forma ou de outra.
Em certas ocasiões pode nos parecer que ruídos, sensações e distrações nos afetam mais do que em outras. Um tenue ruído pode nos perturbar. Não devemos nos aborrecer com isso. Tudo é normal e constitue o caminho que teremos de trilhar. Há, entretanto, períodos em que nos tornamos mais vulneráveis, mais facilmente irritáveis, desencorajados, etc. Também é natural e é somente um estágio que cedo será ultrapassado a medida que continuamos. A causa desse estado de coisas e a crescente atenção em pequenos impulsos que antes passavam desapercebidos. A melhor focalização neles faz com que cada um receba uma energia adicional. Quando, entretanto, os notamos tranquilamente da maneira descrita o efeito é momentâneo e cedo passará. Se continuamos na prática, com firmeza, chegaremos cedo a um estado onde, pelo contrário, cada estímulo, embora visto com maior claridade, possui algo parecido a um absorvedor de choques. Com isso coisas que antes nos fariam “subir pelas paredes” nos deixarão calmamente repetindo: “ouvindo” “ouvindo”, etc. etc..

Se enquanto praticamos a atenção na respiração a mente notar formas imaginárias, cores, luzes, rostos de pessoas, eles devem ser notados como “vendo” sem qualquer interesse ou aversão e a mente deverá logo voltar sua atenção para a respiração.

Apesar de belo como um tapete persa ou um caleidoscópio a imagem diante de nos a melhor coisa a fazer é notar como “vendo” e passar adiante sem nos preocupar com detalhes. O “controle dos sentidos” é descrito no Budismo como “vendo um objeto, nao devemos ser capturados pela sua forma ou detalhes”. O mesmo deve ser feito em relação a qualquer outro sentido. A ordem do dia na Prática de Concentração é: “naquilo que se olha ver somente o que se vê”. (DITTHE DITTHAMATTAM). Em outras palavras “vendo” e passar para diante sem morar no objeto. Quando a mente “mora” em alguma coisa a prática de Concentração cessa. Torna-se então escrava do objeto.

Esta prática do Exercício Básico Respiratório deve ser mantida por períodos de uma hora (ou o que o instrutor recomendar). Entre as sessões os exercícios básicos de andar devem ser praticados em períodos horários. Devem ser alternados com o exercício respiratório.



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EXERCÍCIO BÁSICO DE ANDAR
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Entre as sessões da prática sentada,o meditador deve procurar me local tranqüilo, onde possa caminhar de lá para cá sem ser perturbado. Não precisa ser muito longo. Mesmo o nosso quarto, se não for pequeno demais, pode servir. Ou um corredor, jardim, salão, etc. O melhor neste exercício é que caminhamos mais lentamente do que o fazemos normalmente. A marcha deve ser, entretanto, tão simples e natural quanto permita sua velocidade. Se ocorrer alguma dúvida quanto a isto, o instrutor poderá dar uma demonstração. Durante o período de andar, de lá para cá, a atenção deve estar fixa no movimento das pernas e pés. Devemos notar, a medida que o pé direito começar a levantar do chão: “levantando”. Quando ele se movimentar para frente: “movendo”. Quando pousar no chão: “pisando”. E o mesmo para o outro pé.
De forma exatamente igual à prática sentada, todos os pensamentos e sensações que nos tentam distrair devem ser notificados e postos de lado. Pode acontecer a pessoa olhar alguma coisa e neste caso deverá registrar imediatamente: “olhando” e reverter sua atenção para o movimento dos pés. Olhar para os objetos e notar seus detalhes, mesmo para aqueles que estão no caminho, é o “desejo dos olhos” (RUPARAGA) Esse desejo não faz parte da prática, embora devemos registrar “olhando”, se inadvertidamente o fizemos. O resto são “visões interessantes”, iscas do anzol de MARA (ilusão).

Ao atingir o fim do caminho há necessidade de girar e caminhar na direção oposta. Temos a consciência disso quando falta um passo ou dois para atingir o limite da caminhada. A intenção para fazer a volta deve ser identificada como “intenção” No começo é difícil prestar atenção, pois a volta se faz quase automaticamente. Devemos, no entanto, notar o pensamento a medida que ele ocorre. Neste caso, a intenção existindo, pois a concentração está firme, ela será vista e anotada. Após anotar a intenção de fazer a volta, devemos anotar todos os pormenores dos pensamentos e movimentos envolvidos neste giro. À medida que damos o último passo para frente, começaremos a girar o corpo, devendo então anotar o fato como “girando”. Quando o pé estiver se levantando, imediatamente anotar “levantado”. Procurar identificar todas as fases do giro até a retomada ao caminhar lento de volta. Há inúmeras vezes uma tentação de chegar ao fim do caminho dar uma olhada em alguma coisa interessante. Se este impulso indisciplinado ocorrer deve ser anotado como “intenção”. No caso de a visão distraída tiver ocorrido devemos anotar imediatamente “olhando” e a atenção revertida naturalmente ao movimento dos pés. Não há necessidade, em tais casos, de forçar a mente de volta aos pés. Logo que a concentração é restabelecida a mente, por si própria, sabe o que deve fazer e, automaticamente, dirige-se a isso. O mesmo é verdadeiro em outras ocasiões durante a Prática de Concentração.

O melhor para principiantes é começar o exercício de andar com uma técnica de anotar 3 estágios: “levantando”, “movendo”
e “pisando”. Dependendo da capacidade de quem medita o instrutor pude recomendar o registro de mais ou menos estágios. Em certas ocasiões, por exemplo, quando por motivos práticos não for aconselhado andar vagarosamente, recomenda-se a marcha normal sendo suficiente registrar “esquerda”, “di reita”. Isto pode ser feito nas ruas, quando um caminhar em marcha lenta espantaria qualquer pessoa por mais fleugmática que fosse. O ponto importante não é quantos pontos estão sendo anotados, mas se estão sendo efetivamente registrados, obrigando a mente a abandonar sua atividade normal de “saltimbanco”.



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DURANTE AS AÇÕES DIÁRIAS
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As duas práticas, Respiração e Caminhar, constituem a base da Prática da Concentração, sendo adotadas como uma “técnica” ou particularmente durante um “Curso”, quando podemos organizar nossa vida, de tal forma a termos tempo para meditar.
Mesmo durante um curso de meditação há um número de ações diárias que permanecem. Temos que nos levantar, lavar-nos ir ao banheiro, fazer nossa cama, comer ficar de pé, sentar, etc. Durante todas essas atividades, devemos adotar uma prática semelhante. Na verdade, não há diferença essencial entre a Prática de ficar sentado, fazendo o Exercício Básico Respiratório, e estar sentado, fazendo nossa refeição. Somente quando estamos sentados, fazendo o exercício respiratónio, o que ocorre é simples e regular, portanto, mais fácil do que quando somos obrigados a anotar urna série de ocorrências. Esta é a razão pela qual se escolhe inicialmente a posição sentada para prática. Durante as ações diárias, o mesmo esquema essencial é seguido. O que estiver na mente deve ser visto e anotado sem nos aferrarmos a ela. Após longa experiência na prática, mesmo este simples teste, a fim de verificar se a concentração não foi perdida, pode ser posto de lado. A pessoa vê simplesmente com uma consciência silenciosa, mas implícita, cada objeto com que se depare. Isto não será fácil, principalmente enquanto a mente tentar caçar sombras. Até que obtenhamos grande experiência e progresso na Prática da Concentração, será de bom alvitre manter o registro explícito dos objetos da forma indicada.

Será interessante, a quem medita, ler neste ponto o parágrafo do “Discurso Sobre a Prática da Concentração”, no qual o Buda indica, em resumo, como a prática deve ser mantida nas menores ações da vida, o seguinte: “Quando indo ou vindo, o Bikku age somente em plena consciencia. Seja olhando para frente ou ao redor, ele age com plena consciência. Seja flexionando ou esticando o braço, ele age em plena consciência. Ao vestir o manto, segurar sua tigela, ele age com plena consciência. Seja defecando ou urinando, ele age em plena consciência. Seja de pé, sentando, repousando, falando ou silencioso, ele permanece plenamente consciente”.

Este pequeno parágrafo fala por volumes de textos! Curto, incisivo e estilizado para facilitar a memorização, ele enfatiza as importantes características da vida diária, na qual todas as ações devem ser incluídas — mesmo a resposta aos apelos da natureza. Serve para frisar que nada (NADA MESMO) é trivial ou sórdido em demasia, para que não nos concentremos nele. Este discurso foi feito para os monges (BIKKHUS), daí serem mencionados objetos e atos normais de suas vidas. A rotina de procurar a próxima vila, pedindo esmola pela manhã, carregando todas as suas posses — manto tigela, agulha, etc., comendo o que lhe puserem na tigela, passando o resto do dia, seja “sentado ou andando” em meditação, não sendo, portanto, uma surpresa os artigos e ações aqui descritos. O Buda, entretanto, não enunciou estas regras somente para monges. Elas servem para todos os que tomam sua religião seriamente. Um antigo comentário a este Discurso adverte como algumas mulheres, dirigindo-se ao poço da aldeia para apanhar água, devem praticar a Concentração.

Ao aplicar a prática da Concentração durante essas pequenas ações será melhor se a ação for feita lenta e deliberadamente quanto possível, a fim de permitir que a ação seja notada claramente, em todos os detalhes, sem apressar a mente, o que iria causar somente distrações e o aparecimento de pensamentos associados. Quando praticada de maneira adequada, a Concentração conduz diretamente a tranquilidade mental ( SAMADHI). Sua colocação como estágio anterior ao SAMADHI na Nobre Senda Óctupla claramente indica tal fato. O SANADHI momentaneo não é somente obtido na meditação imóvel, em transe, mas a tranquilidade e silêncio da mente como um estado mental deve ser preservado e mantido através de todas as atividades da vida. Neste estágio a pessoa, tendo parado o fluir do pensamento es tá “livre da inundação” (ASAVA KKHINA). Assim a prática deve principiar desde o momento que despertamos e começamos a notar a sensação do peso do próprio corpo de encontro a cama, que deverá ser rotulada como “sentindo”. A seguir, quando tivermos vontade de afastar a coberta que nos cobre, devemos anotar: “intenção”. Quando afasta mos a coberta será: “movendo”, e assim por diante. Este procedimento deve ser feito com todas as ações: ao lavarmos o rosto mastigando a comida, evacuando-a depois de digerida, escovando os dentes, etc. Ao vermos algo, devemos notar: “vendo”; ao ouvir: “ouvindo”; ao cheirar: “cheirando”; ao provar: “provando”; ao sentir urna sensa ção física: “sentindo”; ao pensar: “pensando”; quando encolherizados: “cólera”; quando querendo algo: “desejando”; quando alegre: “rindo”; etc. A autoconcentração deve ser constante. Pode parecer a muitos que isto seja uma prática dura demais, porém devemo-nos lembrar ela nos leva à Pérola de Grande Preço. Além disso, não há outro caminho. Isto, aliás, foi muito bem dito pelo autor da Imitação de Cristo 111.3.2, ao afirmar. “Por um pouco de dinheiro algumas vezes surgem vergonhosas disputas. Os homens não se cansam de lutar, dia e noite, por assuntos vãos. Mas pela recompensa suprema, a mais alta honra, eles se lamentam pela menor fadiga”. Este esforço conduz, entretanto, a maior paz e felicidade. Mas para alcançá-las cada um tem que pagar o preço, primeiramente.

Na medida do possível, todas as ações devem ser feitas, concentradamente, incluindo na prática coisas como ler, escrever, falar, ouvir, procurando descrever com detalhes todas elas. Vamos tomar mais um exemplo — o caso de comer. Sentando-nos a mesa para comer, o primeiro impulso deverá ser pegar a faca e o garfo. O impulso deverá ser registrado como “intenção”. Caso não seja visto iremos “cegamente” pegar a faca e o garfo. A seguir ao impulso devemos começar segurando o garfo e levá-lo, lento, à boca. Enquanto isso notamos: “leantando”, “levantando”... Ao tocar os lábios devemos anotar: “tocando”; ao mastigar devemos anotar: “mastigando”; ao sentir o gosto: “provando”; ao engolir: “engolindo”; etc... Ao segurar a colher para mexer o chá devemos anotar: “mexendo”, “mexendo” etc... Quando noticiamos pensamentos e ruídos, devemos notar: “pensando” ou “ouvindo”, e a mente deverá voltar as ações. Entre tais ações, a mente deve repousar na sensação da pressão do lugar, onde estivermos sentados. Longe de serem “distrações” ruídos diversos, tais como, ruídos de motores do trafego, aviões, tic-tac de um relógio tornam-se objetos perfeitamente satisfatórios de meditação.



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EXERCÍCIO ADICIONAL RESPIRATÓRIO
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Após algum tempo a mente torna-se mais calma. Habitualmente uma pausa ocorre entre a inspiração e a expiração. Nesta inesperada parada a mente tende a hesitar sentindo não ter qualquer objeto para se concentrar. Tem então a tendência de vaguear. Quando está parada ocorre deve-se permitir a mente sentir uma ou duas sensações que estão sempre presentes no corpo. Deve-se notar, por exemplo, a posição geral do corpo, como um todo, sentado quieto na prática. Isto deve ser anotado como “sentado”. Então a sensação da pressão do chão ou assento da cadeira, sob as nádegas, a pressão das pernas sobre as coxas se estivermos de pernas na posição do lótus Tudo isso deve ser anotado como: “sensação“. Deste modo uns mais pontos a serem anotados devem ser registrados para preencher o vazio verificado na parada respiratória. Essas notificações devem ser feitas sem pressa, naturalmente, com uma velocidade confortável, nem apressada demais, nem lenta, o que poderã provocar pensamentos que distraem. A melhor maneira é tomar as sensações mais proeminentes ou, se tiver alguma constante, tal como o ruído de um avião que passa, ou carro, isso deve ser notado como “ouvindo”, juntamente com outros pontos de sensação, antes que a mente volte à respiração no início da próxima inspiração ou expiração. Assim, tão longa seja a pausa na respiração a pessoa continuará a preenchê-la, notando os diversos pontos de sensação. Algumas vezes a pausa pode ser mais longa — mesmo de vários minutos sem respirar, num estágio mais avançado, durante os quais devemos preenchê-la com a anotação desses pontos proeminentes de sensação, até que sobrevenha, naturalmente, a próxima restpiração. Com esse objetivo alcançado de 3 a 5 pontos, sensações marcantes são suficientes.

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DURANTE A VIDA DIÁRIA
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Ninguém pretende que a prática de Concentração durante a vida diária seja fácil — particularmente nas condições existentes nas grandes cidades modernas. necessário um esforço sustentado, considerável para manter o nível de consciência mental e suportar a constante força centrífuga atuando sobre nos. É um esforço que a maioria não está, talvez, preparada para suportar. Sem essa consciência intensificada e o autodomínio que nos dá a Concentração, a vida degenera num tropeçar constante no terreno áspero das mutáveis condições que o fluir do karma (KARMA) traz aos nossos pés. A evolução humana deve ser para cima, na direção de uma maior consciência e da autoconcentração. Evolua ou morra uma lei da Natureza e certamente um homem sem Concentração está vivendo uma morte viva, envolvido com fantasmas e lutas sem proveito. O Buda disse certa vez: “Os concentrados não morrem. Os descuidados estão como se estivessem mortos” Seria agradável ficar sentado, preguiçosamente, e levar uma vida fácil, mas isso equivale a um sonho de quem fuma ópio. Nossas mentes não nos deixam repousar até que tenhamos vencido a “vitória da vida”, isto é: a vitória sobre o Anseio e a Ignorância. Queremos estar a vontade, “livres”, mas para que isso seja possível depende que o queiramos ser. Se quisermos ser livres da autodisciplina a fim de “gozar” os objetos dos sentidos, isto meramente mostra que nos somos escravos dos sentidos, e o intelecto é um sentido entre outros. Se, de outro lado, deseja­mos nos libertar da escravidão dos sentidos para alcançar autodomínio e autorealização, esta é a verdadeira liberdade. E ela é possível. É a Paz, a Verdade, a Vida mais abundante e a Libertação.
A prática da Concentração na vida diária tende a parecer mais difícil do que é, em virtude de duas razões principais. Primeiro: o indivíduo não está acostumado a ela e, portanto, quando começa, com entusiasmo, a tentar a prática de um grau maior de Concentração na vida, verifica que um bom impulso começa a perder força em face de falta de cooperação do mundo e vai-se encontrar, aparentemente, onde começou. Isto pode ser em grande parte contrabalanceado se a pessoa já certa vez sentiu o “gosto” do caminho, ou seja, já provou o que significa estar concentrado, por exemplo, durante um período de Curso de Concentração em tempo integral, sob a orientação de um instrutor adequado. Os efeitos desses cursos, se periodicamente renovados, auxiliam a manter o momento. Devemos esperar que sobrevenham éocas de aparente fracas só completo na Concentração. A coisa importante é não perder a coragem e recomeçar. Há um refrão que diz: “Os ingleses perdem todas as batalhas, menos a última”. Isto não é verdade, historicamente, mas é algo que pode ser dito, espiritualmente, a respeito daquilo que é o mais santo nos homens. Outra razão de que parecemos ganhar pouca dianteira, mesmo a despeito dos nossos esforços na prática da Concentração, e devido ao inveterado hábito humano de tentar ter o seu bolo e comê-lo. A “Vida Santa”, seja com um manto ou sem ele nas nossas costas, demanda renúncia, um volver do mundo, isto é, dos sentidos. Não significa correr deles, nem a sua rejeição, mas a falta de interesse neles. Como já foi dito, como num refrão no “Discurso da Prática da Concentração” — “abandonar os desejos e aversão ao mundo”. Esta ”Sagrada indiferença” é a entrada segura para a Concentração adequada. Com ela ninguém pode nos distrair, nada pode captar nosso interesse, nem pensamentos sensuais, irritações dividas e uma hoste de pequenos pensamentos e memorias que constantemente invadem
a mente. Esta retirada emocional, a renuncia no interesse, das coisas condicionadas, não interfere, de modo algum, com nossa habilidade em preencher as funções necessárias na vida. Ao contrário, a paz e a claridade da visão trazem muito maior eficiência em alegria e liberdade no conhecimento de que “não sou eu quem age”.

Nenhuma prática é tão adequada para aplicação na vida diária como a Prática da Concentração. E uma prática que pode e deve ser mantida em todas as épocas, nas mais variadas circunstâncias. Diz-se que, assim como o sal serve em todos os temperos, a Concentração adapta-se a todos os evvntos. Relembro a famosa história Zen, do mestre a quem perguntaram como a pessoa devia viver e que respondeu: “Quando com fome, comer. Quando cansado, descançar”. A essa resposta o interlocutor argumentou: “Mas, esta é a maneira que todos vivem!” (O Mestre, tranquilamente, explicou: “A maior parte das pessoas quando comem não estão comendo e sim pensando toda a sorte de imagens e pensamentos, sem sentido”. Esta é a diferença entre viver com ou sem Concentração.

Muitas pessoas dizem: “Não tenho tempo para praticar meditação. Sou um homem muito atarefado”. Não ter tempo para ser
mais consciente ? É uma afirmativa estranha! As pessoas tem medo de que a prática da Concentração, durante o trabalho, interfira com ele. Na realidade é o contrário que acontece. Vamos olhar, entretanto, para enorme quantidade de tempo “perdido” diariamente. Levantar, vestir, o que pensamos quando dirigimos ou estamos sentados na nossa condução? Será útil espiar os anúncios que passam e as pessoas a nossa volta? Fazendo os trabalhos caseiros, o que pensamos? Devemos varrer quando varremos, lavar quando lavamos, comer quando comemos, etc.



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DEIXE AS COISAS SEGUIREM SEU CURSO
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As pessoas tem um quase instintivo pavor de que, a não ser que “pensem” e mantenham o “controle das coisas” elas esquecerão algo importante e as coisas se tornarão erradas. Na realidade, nem a quarta parte dos pensamentos que enxameiam nossas mentes preocupadas é funcional. O resto (3/4) são pensamentos “gafanhotos”. Se as condições são tais para que certa ação seja tomada, anos de condicionamento assegurarão que o impulso ocorra e a melhor maneira é ficar tranqüilo e concentrado, em vez de submerso numa enxurrada de memórias, esperanças, aborrecimentos e preocupações. Confiar na Lei de Karma, na Lei do Condicionamento, ver as coisas tomando lugar, seguro na realização de que “esta agindo por meu intermédio”, “e sou apenas o instrumento”, é a muito mais feliz e concentrada maneira de viver. Naturalmente a resistência do apego e o véu do sentimento errôneo de “estou agindo” causam o fluir dos pensamentos de forma indisciplinada. Maior concentração traz paz, liberdade de emoções errôneas, claro julgamento e senso real de bem-estar. Matai os dois gigantes que habitam na selva das nossas mentes: o Desejo (TANHA) — através da paz e liberdade de ansiedade e emoções maléficas (Alegria, boa vontade, compaixão, permanece) e a Ignorância (AVIJJA) — desapareçe pela claridade da visão e a crescente consciência da verdade do não-ser, (ANATTA). “Isto não e meu! Isto não é o que sou. Esta
não é minha natureza real”. Em outras palavras: “Estes objetos nada tem a ver comigo”. “De maneira alguma tocam meu verdadeiro ser”. “Eu não sou quem faz essas ações”. É a ignorância que nos faz identificar com “nossas” ações e toma a responsa bilidade delas em nossos ombros. Desta forma nos amarramos à Roda do Condicionamento. A constante Concentração da Sabedoria nos libera! Ou melhor, mostra que nunca estivemos presos, exceto em PENSAMENTO!

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POSSAM TODOS OS SERES SER FELIZES
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